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quarta-feira, 3 de junho de 2020

HM125 - Nampula, por José D'Abranches Leitão

HM125 Nampula
A cadeira de rodas, tinha uma história engraçada, digna de ser relatada! 

Era única e por conseguinte quando alguém precisava de ir tirar radiografias ou fazer outro exame, e que necessitasse de ser transportado sentado, eu ficava na cama, no meu quarto, até que a dita cadeira me fosse devolvida!

Uma vez por semana íamos ver um filme ao cinema de Nampula! 
Voluntários não faltavam para me acompanharem, segurando a cadeira, assegurando assim um bom lugar! 
O “coitadinho” devia ter pisado uma “mina” e merecia um bom lugar!
Às vezes era difícil explicar porque que era necessário a ajuda de 4 ou 5 “enfermos” !!!

Sempre que ouvia o Heli, sinal de que mais vítimas da “guerra” vinham para o hospital, lá estava o “apanhado do clima” na sua cadeira de rodas, junto à pista, para dar o apoio possível!

Viria a saber histórias de Mueda bem no coração de Cabo Delgado, outro inferno, onde havia uma hospital de campanha, que alguns companheiros entretanto feridos me relataram como sendo muito rudimentar, sendo a sala de operações, digna de uma cena daqueles filmes em que as pessoas mais sensíveis não devem ver, disseram-me que os mortos estavam espalhados pelo chão, nus, como também os vivos à espera de tratamento: As equipas de cirurgiões amputavam pernas, a torto e a direito, “cortando o mal pela raiz” 

Explicando melhor, contavam que muitas vezes só eram amputados pés, mas que mais tarde as “gangrenas”, originavam já em Nampula ou mesmo no Hospital da Estrela em Lisboa, teria o infeliz de se submeter a nova cirurgia e a lá ficava sem a perna toda!

Um dia, entra pelo meu quarto dentro uma alta patente militar, indagando quem era o Furriel Milº Abranches Leitão! 
Com alguma timidez, lá levantei o braço, e pensando que me iria anunciar “algum castigo” pelas tropelias e irreverências. 
Fui informado de que o Estado Maior do Exercito tinha recebido um telegrama de Lisboa, para saber se o militar em questão ainda estava vivo! 
Vim a saber que a família “moveu montanhas” para sabe notícias minhas, pois desde a entrada no HM125, que tinha deixado de escrever. Uff!
A partir deste momento o Sargento enfermeiro, o tal do hematoma, começou a tratar-me com mais respeito! Porque seria???

Logo que me senti em condições de dar uns passos, largando a cadeira de rodas, e como o Carvalho calçava 44 e não precisava dos sapatos tão depressa, lá conseguia enfiar estas “barcas”…e me desenfiava pelo arame farpado, iludindo o sentinela e indo até ao Bagdad, que ficava a cerca de 1000 metros do Hospital, beber uns Whisky´s! 
Recordo-me que o preço, não dava para mais de 2, sendo o 3º já de L34, brandy com 2 pedras de gelo, bem mais barato e servido em copos escuros. 
O que era preciso era impressionar umas garotas bem giras que frequentavam o dito e bar, e mais tarde vim a saber serem filhas de altas patentes da Força Aérea.

O regresso era feito, dolorosamente, e no dia seguinte lá estava o enfermeiro a fazer os curativos, interrogando-se como é que era possível, que a dormir, os pontos pudessem rebentar!

– Pesadelos meu amigo, originam que caia da cama abaixo! 
Dizia-lhe eu! 
Ele não
era “burro.!!!
José Leitão
CCav 2752

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Que dança macabra, por José Capitão Pardal

 

 


Devo ter estado ali (Hospital de Mueda), para onde fui evacuado, em Março de 1973, após ferimento grave, no qual recebi os primeiros tratamentos.

Ali terei estado durante um dia e uma noite.
Como estava (ferido e com morfina), nem me lembro se lá estive...

Depois meteram-me numa maca manhosa, atiraram-me para um Dakota da 2ª guerra mundial, junto com outros feridos e mortos em caixões e com um cabo enfermeiro a acompanhar aquilo tudo, que durante o trajeto nunca mais vi...

Aquele ferro velho batia por todos os lados e quando se inclinava, os caixões e as macas com os feridos misturavam-se, numa dança macabra difícil de descrever...

Até que chegámos ao Hospital Militar de Nampula, onde durante os quase 5 meses que lá estive fui sujeito a várias cirurgias.
 
Após esses quase 5 meses, ainda com dificuldade em mover o punho esquerdo, com uma cicatriz lombar não totalmente curada e sem saber que o estilhaço da mina me tinha afetado em definitivo o rim direito, fui recambiado para a guerra, sem qualquer restrição.
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