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quarta-feira, 15 de abril de 2020

VOLTEI A ÁFRICA (2º. episódio), por Livre Pensador

VOLTEI A ÁFRICA (2º. episódio)
A ilha de S. Tomé foi descoberta em 21 de Dezembro de 1470 pelos navegadores portugueses Pêro Escobar e João de Santarém. 



Os seus 150.000 habitantes (aprox.) vivem, conforme eles definem, em regime "LEVE-LEVE", ou seja, "devagar, muito devagar que não tenho pressa"! 
Outra coisa não seria de esperar debaixo dum sol inclemente próprio do equador! 



Naquela terra a população só precisa de esticar a mão para colher bananas, fruta pão, papaias, matabala, jaca, cocos, etc. 
Dos coqueiros ainda conseguem extrair a seiva que, depois de fermentada, funciona como vinho.



Naquela terra a população só precisa de "meter a mão" no oceano para apanhar o peixe que quer. 
Naquela terra a população tem galinhas e porcos criados à porta de casa e em total liberdade. 
É normal os carros terem de parar na estrada para dar "prioridade" às galinhas ou porcos que a atravessam. 



Com toda esta fartura e riqueza, dizia o nosso guia local: qual a necessidade de trabalharmos? 
E acrescentou em jeito de piada: há quem diga que somos desgraçados! 
É mentira! 
Desgraçados são vocês que precisam de trabalhar se quiserem comer!!! 



Também dizia o guia, que a abundância de peixe e marisco pode ficar comprometida dentro de alguns anos dada a quantidade de barcos chineses que pescam nas águas territoriais de S. Tomé. 

Porém é pena que S. Tomé tenha parado no tempo. 
Da era colonial até aos dias de hoje nota-se que nada foi feito de novo, ou antes, muito tem sido destruído por falta de conservação e/ou manutenção após a independência em 12 de Julho de 1975. 
O multibanco, por exemplo, apenas funciona para cartões de S. Tomé. 

Quem é estrangeiro só consegue ter dinheiro levantando no banco e apenas com cartão de crédito. 
Os bancos aproveitam e praticam o "tiro ao turista", aliás, utilizado em tudo na ilha. 
Para levantar 33.000 dobras (moeda oficial) a que corresponde 1.300 euros, cobraram 102 euros de comissões, taxas e taxinhas! 

Turisticamente falando a ilha proporciona aos seus visitantes magníficas praias de areia branca e limpa recheadas de palmeiras e com águas cristalinas e tépidas. 
O acesso à maior parte delas tem de ser feito por autênticas picadas e de jeep. 



Para além disso, são proporcionadas visitas às tão características roças da era colonial onde havia produção abundante de café e cacau. 
Algumas roças estão completamente abandonadas, uma ou outra vão tentando subsistir em "serviços mínimos" no cultivo do cacau e café, e ainda uma ou outra foram convertidas para turismo com espaço de hotelaria e restauração. 

Mas, como este relato já vai longo, vou deixar para o próximo "episódio" a descrição de como funcionava uma roça, para que se perceba a sua organização no contexto colonial. 

segunda-feira, 13 de abril de 2020

VOLTEI A ÁFRICA (3º. episódio), por Livre Pensador

Livre Pensador
13/04/2020
VOLTEI A ÁFRICA (3º. episódio)
Na ilha de S. Tomé os colonos portugueses dedicaram-se à criação de explorações agrícolas de cacau e café, designadas por roças. 

Existiam grandes e pequenas roças e o seu número total chegou a atingir a centena e meia. 
As pequenas normalmente vendiam a sua produção às grandes roças. 
Estas, cuja área oscilava os mil hectares eram completamente auto-suficientes. 
Tinham camaratas para os escravos, casas para os capatazes, oficinas de manutenção, estufas para a secagem do café e cacau, rede ferroviária e até hospital. 

O hospital era necessário para tratar algumas das epidemias próprias da época ... e não só! 

Em cada roça, a sua linha férrea destinava-se à recolha e transporte das colheitas até às estufas, feito em pequenos vagões puxados por uma locomotiva a vapor. 

A ilha de S. Tomé que tem uma área de 900 Km2, aproximadamente a área de Lisboa e arredores, chegou a ter 200 Km de linhas de comboio. 
A roça Monte Café fundada em 1858/1868 que visitei, é um desses exemplos e funciona actualmente como roça museu onde é possível ficar a conhecer toda a sua história. 
Dispunha dum efectivo que rondava os 2500 escravos. 
Trabalhavam de sol a sol e todos tinham objectivos a cumprir. 
Se falhassem eram apelidados de "malandros" e o capataz dava-lhes o respectivo "tratamento" e assim passavam uns dias no hospital. 
Por exemplo, às mulheres estava reservada a tarefa de escolher e separar os grãos de café. 
Cada uma tinha de o fazer a 30 Kg de café por dia, sob pena de passar uns dias de "descanso" no hospital. 
Também eram considerados "malandros" todos aqueles que tentavam fugir da roça. 
Para albergar todos os "malandros" o hospital era, normalmente, o maior edifício da roça. 

Todos estes escravos eram oriundos principalmente de Angola e até de Cabo Verde. 
Em Portugal, o comércio de escravos (não a escravatura) terminou oficialmente em 1761. 
Em S. Tomé a escravatura terminou em 1900. 
Os donos das roças foram então obrigados a fazer "contratos de trabalho" com salário descriminado, e assim os escravos passaram a ser considerados trabalhadores. 
Folhas de salário dessa época expostas na roça Monte Café, provam que a maioria dos "novos trabalhadores" nada recebiam depois de todos os "descontos" e "multas" que lhes eram aplicados!
Assim se compreende que S. Tomé/Portugal tenha sido o maior exportador mundial de cacau e café à custa de mão de obra quase a "custo zero"! 
A maior parte das roças estão hoje abandonadas.

Uma ou outra aproveitou o despertar do turismo na ilha e foi reconvertida para hotelaria, restauração e turismo. 

É o caso da Roça Saudade onde nasceu o escritor e artista plástico Almada Negreiros em 1893, bem como a Roça S.João dos Angolares onde pontifica o chefe João Carlos Silva autor do antigo programa de TV "na roça com os tachos".