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domingo, 19 de julho de 2020

NATAL DE 1971 em Macomia... por José D'Abranches Leitão

Desaparecido em combate???
Não! Ainda respiro!
NATAL DE 1971
Tal como tinha prometido ao Duarte Pereira, eis o ataque ao aquartelamento de Macomia- Natal de 1971.



O dia começou com a azáfama habitual, render dos sentinelas, o café com leite com um bocado de "carcaça" que tinha um sabor especial, ainda quente, pois os padeiros quiseram dar-lhe um gosto natalício. 
O meu grupo de combate, para variar, saiu num patrulhamento de rotina. 
O aldeamento, aqui e ali com o fumo característico de fogueiras, o colmo das palhotas tão característico de África. 
 As crianças semi nuas a correrem alegres....o choro dos que andavam colados as costas da mãe, enrolados numa capulana de cores garridas, os seios da mãe descaídos, quando se debruçava para varrer a entrada da palhota! 
A mandioca, o pilão. ...a farinha moída com o "almofariz"...o som do bater do "pau", com as mãos ageis .... Flashs que passados 45 ans ainda retenho na memória. 
Alguns soldados, sentados nos bancos corridos do "pincha", vão lembrando o Natal da sua santa terrinha! 
O bacalhau, as couves, o azeite, as filhoses, as rabanadas, o bolo-rei com a fava, o pão caseiro, a broa, as bolas, tão típicas feitas com sardinha ou bacalhau, que o forneiro fazia, após cada fornada de broa, no forno comunitário da aldeia. 
As prendas, o presépio, com os pequenos bonecos de barro, com o menino Jesus, em destaque....a imaginação de cada um, o musgo, o riacho, as ovelhas...a gruta com o calor do bafo da vaquinha, do burrito...
Enfim o imaginário de cada um, para atenuar um pouco o degredo, a distância, a saudade dos entes queridos, que se reúnem à volta da fogueira na cozinha, para os preparativos da Consoada. 
Ao regressar a meio da tarde...começo a idealizar a noite de Natal. 
Uns ramos de palmeira....a mesa grande de tábuas corridas, as toalhas, as pinturas com motivos natalícios....o centro de mesa....as luzes...os pratos, os guardanapos com um sino de Natal pintado, imaginação do "artista plástico" da Companhia, o Furriel Oliveira....o gira-discos preparado para ouvirmos o Zeca Afonso....os vinis singles que levei...
Os abraços, os desejos de um Feliz Natal, ao camarada que passa por nós, enfim....tudo estava a 'postos para que a Noite de Natal, fosse a "mais familiar" possível. 
 O 1° Sarg Urze com a sua guitarra, já aquece os dedos, com umas variações em ré menor. 
O fado de Lisboa também iria ser cantado à desgarrada! 
E alguns fadistas improvisados...já aqueciam s gargantas!!!
Recordo, que tinha colocado no prato do gira discos um single com o "Menino d'oiro" do Zeca Afonso! Vejo que algumas lágrimas correm pelas faces de alguns! 
Durante a nossas estada na Cruz Alta/Serra do Mapé, consegui que quase toda a Companhia começasse a gostar de Fado de Coimbra, pois mesmo com um gerador a dar o berro, o gira-discos. ...funcionava com os únicos discos que havia...os meus singles de 45 rpm...do Zeca Afonso!
O bacalhau cosido fumegante começa a chegar à mesa ... as batatas cozidas....as couves...os galheteiros...as cervejas distribuem-se ao longo da mesa....e o vinho tinto!!!
As gargalhadas....os sorrisos....de repente são interrompidos pelo silvo característico dos morteiros 60 ou 82....
Estamos a ser atacados! 
O IN quer estragar-nos a ceia de Natal. 
Gera-se alguma confusão. ...alguns escondem-se debaixo da mesa, muita correria. 
A pedido do Capitão Marinho Falcao, conduzimos as mulheres e filhos de alguns oficiais, para o bunker da Casa do Adiministrador de Macomia. 
Após alguns minutos, seriam 15 a 20 minutos do ataque, verificamos que todas as granadas passaram por cima do aquartelamento, e vão explodir no meio do aldeamento! 
Consta-se que haverá mortos entre a população! 
Entretanto chegam a correr o Gouveia e o Carias Mendes, que ficaram no aldeamento para comprarem umas mangas !! (?)....
Mais uma vez, para variar, o 4° Grupo de Combate, sai para patrulhamento, sob as ordens do Major de Operações, vamos até ao Laku. 
O senhor Major queria, via rádio, que fizéssemos uma incursão no vale! 
A noite estava escura como breu! 
Um soldado africano, destemido, mas cauteloso, vai dizendo que será um risco grande pois o IN estará emboscado à nossas espera!
Tinha razão, pois no dia seguinte, verificamos que havia indícios da sua presença e até o rodado de um canhão sem recuo, ainda era visível no capim, para além de termos encontrado um morteiro 60, completamente enterrado no matope!
Depois de mais uma comunicação, via rádio, regressamos ao aquartelamento! 
O bacalhau estava à nossas espera. 
O Gouveia, entre dentes, vai-me sussurrando ao ouvido que apanhou um susto do caraças, pois estava com as calças na mão, a "negociar"...as mangas, quando começou o ataque !!!???? 
O Carias Mendes....ri...a bom rir....mas não ganharam para o susto!
Entretanto a noite vai longa e algumas garrafas de Whisky e muitas Laurentinas, vão "afogando" as mágoas! !!!
Canta-se à desgarrada, com os acordes da guitarra do 1° Sarg, que fez questão de tirar a boina e colocar entre os colarinhos da camisa um lenço. ...de fadista!!!
Por ultimo, o desabafo do Sarj Ajudante Musico, Anjo ( que compôs a letra do hino do Batalhão )
: -Menino (era assim que me tratava)! Estava a ver que já não voltávamos à nossa Coimbra!!!
E o Carlos David (tb de Coimbra) ...associou-se a nós num fraterno abraço! 
Fim
UM FELIZ NATAL PARA TODOS!
Abraço 
José Leitão

quarta-feira, 22 de abril de 2020

A viagem para África..., por Luís Leote - Fonte: Guerra Colonial 1961-1974

A viagem

A viagem para África começava muito antes do embarque. 
O processo que levava um jovem até Angola, Guiné ou Moçambique iniciava-se habitualmente logo após o final da instrução da especialidade. 


Para um atirador, e tanto fazia sê-lo de Infantaria, Cavalaria ou Artilharia, após ser dado como pronto vinha a ordem de mobilização. 
O caso mais vulgar e típico era o de o militar pertencer a uma companhia e esta a um batalhão.

A ordem de mobilização originava a guia de marcha para a unidade mobilizadora. 
Aí se juntavam os militares vindos dos vários centros de instrução, os graduados e os comandantes. 
A companhia e o batalhão já tinham um número de código atribuído e, aos poucos, surgiam os especialistas diversos, os condutores, transmissões, enfermeiros e cozinheiros, de modo a que se preenchesse o quadro orgânico respectivo.



Enquanto se formava a unidade, realizavam-se os exercícios de instrução - IAO, a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional - com os conselhos sobre o que fazer em África para sobreviver. 

Recebiam-se as vacinas, o camuflado e, por fim, a unidade estava pronta.
Chegava a ordem de embarque e então o contingente formava na parada do quartel. 
Nos primeiros tempos, o capelão rezava uma missa campal, que depois caiu em desuso; o comandante da unidade mobilizadora, um coronel, proferia umas palavras alusivas à missão e entregava o guião ao comandante do batalhão mobilizado, um tenente-coronel, ou então da companhia, um capitão; as tropas desfilavam ao som da música, era concedida a licença de dez dias antes de embarque e pagas as ajudas de custo. 



Neste momento, o militar era um mobilizado, ia a casa, despedia-se da família, fazia umas asneiras por conta, arranjava umas correspondentes para lhe escreverem, ou umas madrinhas de guerra, e voltava à unidade mobilizadora para daí iniciar verdadeiramente a viagem.

Neste regresso faltavam uns quantos camaradas, que tinham decidido dar o salto para o estrangeiro ou baixado ao hospital com uma doença mesmo a calhar, mas os que restavam formavam de novo na parada do quartel, com as malas, e embarcavam nas viaturas militares para a estação de caminho de ferro mais próxima.

Na estação, quase sempre de noite, o contingente embarcava num comboio especial em direcção a Lisboa, ao Cais da Rocha ou ao de Alcântara.




O navio que os iria levar estava atracado e as famílias apinhavam-se nas varandas da gare marítima com lenços de acenar, cartazes com o nome do militar, para chamar a atenção, e lágrimas da despedida.

A tropa, vinda de vários pontos em quantidade suficiente para encher o navio, desfilava de novo, agora em continência perante um alto representante militar, com as senhoras do Movimento Nacional Feminino e da Cruz Vermelha a distribuírem lembranças e mais folhetos sobre o território de destino.

Chegava o momento do embarque. 
Subiam-se as escadas e arrumava-se a bagagem junto ao beliche armado nos porões, transformados em casernas. 

Depois, voltava-se ao convés, lutava-se por um lugar na amurada ou trepava-se aos mastros, para os últimos acenos.

Por volta do meio-dia, o navio recolhia as escadas e os cabos, a sirene apitava e, durante alguns anos, a instalação sonora tocava a marcha intitulada "Angola é Nossa", independentemente do destino - um ritual abandonado nos anos mais próximos do fim da guerra.

O navio afastava-se lentamente, virava a proa à foz do Tejo, passava por baixo da ponte e deslizava diante da Torre de Belém.

A fome já apertava e eram dadas instruções para a primeira refeição abordo. 
Os oficiais seguiam para a primeira classe, os sargentos para a segunda e os praças para a terceira, Neste caso, e dada a grande quantidade de tropas embarcadas, havia um sistema de self-service. 
Cada grupo nomeava os seus faxinas, que se aproximavam dos caldeirões, montados à proa e à ré, para receber um tacho de sopa, um de «segundo», o pão e a fruta, que redistribuíam aos seus camaradas, no regresso aos seus postos. 
Comia-se como num piquenique, sentado no convés.
Este sistema já funcionava mal com o mar calmo, mas piorava nos dias de tempestade. 
Nesses dias, os respingos do mar salgavam a comida, os faxinas desequilibravam-se com o balanço, entornando a sopa, e os restos espalhados ajudavam a escorregar os que vinham em sentido contrário. 
Valia nessas ocasiões o enjoo da maioria, que os tornava menos exigentes na qualidade e quantidade da alimentação.

A meio da viagem realizavam-se.exercícios de salvamento a bordo, e todo o contingente enfiava o colete salva-vidas e cada um apresentava-se junto à baleeira que lhe estava destinada em caso de naufrágio. 
Tiravam-se umas fotografias e estava passada mais uma tarde.

Os dias de calma eram gastos a jogar às cartas e a receber alguma instrução sobre o destino, em que ninguém, verdadeiramente, queria pensar.

A passagem do Equador fornecia o pretexto para uma cerimónia da praxe e, entretanto, aproximava-se a chegada, que, quase sempre de manhã, era o tempo da curiosidade de África, o tempo de refazer as malas e do desembarque. 

Nova formatura, agora ao calor, um desfile e um discurso. 
Depois, a partida para um campo militar, o Grafanil, em Luanda, o Cumeré, em Bissau. Aqueles para quem Moçambique era o destino, prosseguiam viagem de Lourenço Marques para norte, até à Beira, Nacala ou Porto Amélia. 
A partir daqui, seguiam-se os dois anos da comissão.

Fonte: Guerra Colonial 1961-1974

É ilusório pensar-se que África são as lindas paisagens..., por António Encarnação

António Enc

É ilusório pensar-se que África são as lindas paisagens.

Os milhares de fotos de África que circulam nas redes sociais, são a prova, para mim, de que não estamos a entender nada.



África, são as pessoas.
Pessoas com quem temos de partilhar e de aprender, ou não, depois de abandonadas as respostas absolutas, os pressupostos garantidos e os figurinos de organização e de desenvolvimento que carregámos na bagagem de vinda.

Se conhecermos as pessoas, não há mais segredos ou surpresas. 

Entendemos as casas, as ruas e os países, entendemos a cultura e o desenvolvimento, entendemos o passado e o presente.

A África, tal como a queremos ver e mostrar, não existe.


segunda-feira, 20 de abril de 2020

Os trabalhos liquidatários e o adeus a África, por Paulo Lopes


Paulo Lopes




Luís Leote, sem te querer massacrar, toma lá a resposta à tua pergunta, extraindo do livro apanhando o final de um capítulo e o início de outro! :-) :-) :





A partir da Beira, eu, o capitão Salgado e o primeiro sargento, separámos-nos da restante Companhia e iniciámos os nossos (?) trabalhos liquidatários. 




Por muito estranho que possa parecer, ao despedir-me da restante família que ia tomar rumo às suas casas — verdadeiras casas — cortou-se, como por encanto, o cordão umbilical de tanto tempo, de companheiros de tantas lutas, de tanto sofrer. 
Parecia que apenas nos tínhamos conhecido numa esplanada de um qualquer café, numa conversa banal e apenas isso! 
Estranho! 
Estranhamente estranho! 
Mas foi isso mesmo que eu vivi nesta despedida! 
Não sei como teria sido se tivesse ido com todos até Lisboa. 
Se a forma de despedida seria diferente. 
Não sei... Também não sei o dia exacto em que eles partiram da Beira para Lisboa pois já estávamos vagueando pelas burocracias da tal liquidatária, passeando com documentos na mão, com total desconhecimento do seu conteúdo e do que fazer com eles. 
Ainda hoje não sei bem o que eram! 




Sei que voávamos entre Porto Amélia, Beira, Nampula e Lourenço Marques. Tanto eu como o capitão, pouco ou nada "liquidatávamos", deixando esse soberbo prazer ao primeiro-sargento que, empenhadamente, tratava de toda a papelada! 
E que papelada! 





Aqui sim... aqui nestes quartéis e repartições sim... aqui já vi aquelas lustrosas fardas, coloridas com divisas de belo parecer. 
Aqui já conseguia detectar verdadeiros heróis (da banda desenhada).
Devidamente fardados e duma apresentação invejável que colocavam o nosso exército numa plataforma de grande representação militar Portuguesa! 
Altos defensores da pátria. 
Mas mesmo assim nunca os vi a fazer grande coisa! 
Azar meu! 

Chegava sempre na altura do merecido descanso destes bravos combatentes e então via-os nas ruas da cidade, ou a saírem das repartições, nas suas (nossas) luxuosas viaturas conduzidas por escravos feijões verdes a caminho dalguma operação de combate no seio dos seus familiares, que os esperavam na difícil batalha de tirarem as espinhas ao belo peixe assado no forno, cozinhado e servido por outros escravos que trabalhavam nas suas (nossas) luxuosas casas.


UM ADEUS A ÁFRICA (que nunca foi, não é, nem será minha) 

Afinal não tinham sido capazes de destruir completamente os sentimentos humanos que tinha trazido comigo quando saí de Lisboa.
Qualquer coisa de bom ainda tinha ficado dentro de mim: sem saber porquê nem porque não, entrou no meu pensamento — enquanto navegava pelas ruas das diferentes cidades de Moçambique, ainda de camuflado já gasto e calejado encostado à minha pele— uma constante e preocupada pergunta: como é que teria corrido a primeira picada de regresso à Mataca aos nossos substitutos?
O meu pensamento voou pelo imenso território e transportei o desejo sincero de que tudo tivesse corrido bem!

Apesar do estado de espírito ser bem diferente daquele que me tinha acompanhado durante largo e vasto tempo, começava a ficar com uma enorme ansiedade no corpo por tanta demora para a definitiva partida.

Acabaram em princípios de Julho de mil novecentos e setenta e quatro, todos estes trabalhos liquidatários.

Finalmente, tínhamos viagem marcada para Lisboa: dia vinte e oito de Julho de mil novecentos e setenta e quatro saímos de Nampula com destino à Beira para, no mesmo dia, apanharmos o avião até Lisboa.
E assim foi... Assim foi mas só para o capitão e o primeiro-sargento.
Eu fiquei!
Um engano mecanográfico mantinha-me preso e à espera de nova marcação.
Mais uns dias de separação do abraço aos meus!
Mas, dia um de Agosto de mil novecentos e setenta e quatro (o meu verdadeiro vinte e cinco de Abril) saí da Beira com destino a Lisboa: uma lágrima de alegria escorria pela minha face.



Um adeus a África que nunca foi, não é, nem será, minha!

In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"

VOLTEI A ÁFRICA (4º e último episódio), por Livre Pensador

Livre Pensador
16/04/2020
VOLTEI A ÁFRICA (4º e último episódio)

A ilha do Príncipe está situada a cerca de 170 km da ilha de S.Tomé, ou seja, a quase 30 minutos de avião. 

Tem uma população aproximada de 7000 habitantes e a capital, Santo António que tem cerca de 1200 habitantes é considerada a capital mais pequena do mundo. 



Toda a ilha está coberta por selva tropical o que nos transporta à sensação de estar na África genuína.



Por exemplo, a energia eléctrica só funciona entre as 6 e as 24 horas. 

Também lá imperaram as roças como motor da economia, mas que actualmente estão desactivadas na sua maioria, restando uma ou outra adaptadas ao turismo. 

As suas praias são espectaculares, ainda mais belas que em S. Tomé, mas com as mesmas dificuldades de acesso, como é o caso da Praia Banana, Praia Boi, Praia Grande e outras. 



Dispõe ainda de bonitas cascatas (cascata do Rio Baixarel, cascata Oquê Pipi, etc.), cujos acessos só são possíveis por trilhos percorridos através da selva. 

A maior atracção turística da ilha do Príncipe é, sem dúvida, a visita à Praia Grande onde se pode observar a desova e/ou eclosão das tartarugas. 


A desova verifica-se entre Setembro e Fevereiro, e a eclosão nos meses de Novembro a Abril. 
Este "fenómeno" na praia é controlado dia e noite por vigilantes da natureza, funcionários da Associação das Tartarugas Marinhas. 
Sempre que uma tartaruga põe os seus ovos na praia, num buraco que escava e que atinge 40 cm de profundidade, é espetada uma estaca numerada na areia, a indicar o local da desova. 
Assim, controlam a data da desova, bem como a data em que acontecerá a eclosão. 



A Praia Grande tinha desde Setembro de 2019 até ao dia 21 de Março de 2020 "apenas" 994 ninhos de ovos. 
Todos os dias nascem tartarugas de um ou mais ninhos. 
Assim que saem do solo, com apenas 6 cm de comprimento, caminham apressadamente para o mar. 
De quando em vez param por poucos segundos. 
É para memorizarem o local onde nasceram, segundo explicou o vigilante, e acrescentou: daqui por 20 a 25 anos voltam a esta mesma praia para desovar!!! 

Que maravilha que é a Mãe Natureza!!! (fim)

quarta-feira, 15 de abril de 2020

VOLTEI A ÁFRICA (2º. episódio), por Livre Pensador

VOLTEI A ÁFRICA (2º. episódio)
A ilha de S. Tomé foi descoberta em 21 de Dezembro de 1470 pelos navegadores portugueses Pêro Escobar e João de Santarém. 



Os seus 150.000 habitantes (aprox.) vivem, conforme eles definem, em regime "LEVE-LEVE", ou seja, "devagar, muito devagar que não tenho pressa"! 
Outra coisa não seria de esperar debaixo dum sol inclemente próprio do equador! 



Naquela terra a população só precisa de esticar a mão para colher bananas, fruta pão, papaias, matabala, jaca, cocos, etc. 
Dos coqueiros ainda conseguem extrair a seiva que, depois de fermentada, funciona como vinho.



Naquela terra a população só precisa de "meter a mão" no oceano para apanhar o peixe que quer. 
Naquela terra a população tem galinhas e porcos criados à porta de casa e em total liberdade. 
É normal os carros terem de parar na estrada para dar "prioridade" às galinhas ou porcos que a atravessam. 



Com toda esta fartura e riqueza, dizia o nosso guia local: qual a necessidade de trabalharmos? 
E acrescentou em jeito de piada: há quem diga que somos desgraçados! 
É mentira! 
Desgraçados são vocês que precisam de trabalhar se quiserem comer!!! 



Também dizia o guia, que a abundância de peixe e marisco pode ficar comprometida dentro de alguns anos dada a quantidade de barcos chineses que pescam nas águas territoriais de S. Tomé. 

Porém é pena que S. Tomé tenha parado no tempo. 
Da era colonial até aos dias de hoje nota-se que nada foi feito de novo, ou antes, muito tem sido destruído por falta de conservação e/ou manutenção após a independência em 12 de Julho de 1975. 
O multibanco, por exemplo, apenas funciona para cartões de S. Tomé. 

Quem é estrangeiro só consegue ter dinheiro levantando no banco e apenas com cartão de crédito. 
Os bancos aproveitam e praticam o "tiro ao turista", aliás, utilizado em tudo na ilha. 
Para levantar 33.000 dobras (moeda oficial) a que corresponde 1.300 euros, cobraram 102 euros de comissões, taxas e taxinhas! 

Turisticamente falando a ilha proporciona aos seus visitantes magníficas praias de areia branca e limpa recheadas de palmeiras e com águas cristalinas e tépidas. 
O acesso à maior parte delas tem de ser feito por autênticas picadas e de jeep. 



Para além disso, são proporcionadas visitas às tão características roças da era colonial onde havia produção abundante de café e cacau. 
Algumas roças estão completamente abandonadas, uma ou outra vão tentando subsistir em "serviços mínimos" no cultivo do cacau e café, e ainda uma ou outra foram convertidas para turismo com espaço de hotelaria e restauração. 

Mas, como este relato já vai longo, vou deixar para o próximo "episódio" a descrição de como funcionava uma roça, para que se perceba a sua organização no contexto colonial. 

segunda-feira, 13 de abril de 2020

VOLTEI A ÁFRICA (3º. episódio), por Livre Pensador

Livre Pensador
13/04/2020
VOLTEI A ÁFRICA (3º. episódio)
Na ilha de S. Tomé os colonos portugueses dedicaram-se à criação de explorações agrícolas de cacau e café, designadas por roças. 

Existiam grandes e pequenas roças e o seu número total chegou a atingir a centena e meia. 
As pequenas normalmente vendiam a sua produção às grandes roças. 
Estas, cuja área oscilava os mil hectares eram completamente auto-suficientes. 
Tinham camaratas para os escravos, casas para os capatazes, oficinas de manutenção, estufas para a secagem do café e cacau, rede ferroviária e até hospital. 

O hospital era necessário para tratar algumas das epidemias próprias da época ... e não só! 

Em cada roça, a sua linha férrea destinava-se à recolha e transporte das colheitas até às estufas, feito em pequenos vagões puxados por uma locomotiva a vapor. 

A ilha de S. Tomé que tem uma área de 900 Km2, aproximadamente a área de Lisboa e arredores, chegou a ter 200 Km de linhas de comboio. 
A roça Monte Café fundada em 1858/1868 que visitei, é um desses exemplos e funciona actualmente como roça museu onde é possível ficar a conhecer toda a sua história. 
Dispunha dum efectivo que rondava os 2500 escravos. 
Trabalhavam de sol a sol e todos tinham objectivos a cumprir. 
Se falhassem eram apelidados de "malandros" e o capataz dava-lhes o respectivo "tratamento" e assim passavam uns dias no hospital. 
Por exemplo, às mulheres estava reservada a tarefa de escolher e separar os grãos de café. 
Cada uma tinha de o fazer a 30 Kg de café por dia, sob pena de passar uns dias de "descanso" no hospital. 
Também eram considerados "malandros" todos aqueles que tentavam fugir da roça. 
Para albergar todos os "malandros" o hospital era, normalmente, o maior edifício da roça. 

Todos estes escravos eram oriundos principalmente de Angola e até de Cabo Verde. 
Em Portugal, o comércio de escravos (não a escravatura) terminou oficialmente em 1761. 
Em S. Tomé a escravatura terminou em 1900. 
Os donos das roças foram então obrigados a fazer "contratos de trabalho" com salário descriminado, e assim os escravos passaram a ser considerados trabalhadores. 
Folhas de salário dessa época expostas na roça Monte Café, provam que a maioria dos "novos trabalhadores" nada recebiam depois de todos os "descontos" e "multas" que lhes eram aplicados!
Assim se compreende que S. Tomé/Portugal tenha sido o maior exportador mundial de cacau e café à custa de mão de obra quase a "custo zero"! 
A maior parte das roças estão hoje abandonadas.

Uma ou outra aproveitou o despertar do turismo na ilha e foi reconvertida para hotelaria, restauração e turismo. 

É o caso da Roça Saudade onde nasceu o escritor e artista plástico Almada Negreiros em 1893, bem como a Roça S.João dos Angolares onde pontifica o chefe João Carlos Silva autor do antigo programa de TV "na roça com os tachos". 

domingo, 5 de abril de 2020

Iremos conhecer o pior Day After de todos os tempos?, por António Encarnação

António Enca
 
Iremos conhecer o pior Day After de todos os tempos?
- Provavelmente. 

Fragilidades e desigualdades estão a ficar, agora, mais visíveis, como na Itália e como vai ser em muitos países, principalmente do Hemisfério Sul.
O medo, a insegurança e as dificuldades crescem a um ritmo assustador e as notícias diárias dos efeitos da pandemia, em nada ajudam. Há medo que perdurará por muito tempo.

As actividades paralelas que sustentaram milhões de pessoas, na Europa mas principalmente em África, irão desaparecer e até eventuais ajudas internacionais pouco poderão fazer, porque não há registos, nem organização, nem estatísticas, nem quaisquer números, tornando-se impossível avaliar as necessidades, para dimensionar as soluções.

África

A tudo isto acresce que esta guerra não irá terminar com um reconfortante e apaziguador armistício, como aconteceu nas outras guerras, em que um dia, depois de umas vitórias, uns acordos e umas assinaturas, foi possível anunciar na rádio "a guerra acabou".
Desta vez, porque as frentes de batalha são milhares e os envolvidos são muitos milhões, porque há números desconhecidos, porque o combate está em fases distintas, com uns quase no início do processo e outros a terminar, o fim pleno da guerra, irá demorar muito tempo a ser atingido. 

Muitos já prognosticaram que 2020 está perdido, mas talvez nem 2021 seja suficiente e, quem sabe, se não são necessários vários anos para que desapareçam todas as dúvidas, porque quanto a efeitos, iremos senti-los a perder de vista.

Não será porque um país consegue debelar a pandemia, que vai ficar bem. 
Pode conseguir que não haja mais vítimas e isso é uma grande vitória, mas vai ter de se defender dos possíveis "reacendimentos", com estados de emergência duros, regras rígidas, precauções firmes, fronteiras fechadas e, entretanto e como consequência, continuará a não conseguir condições para ter uma vida, ainda que simples, pobre e diferente do que conhecemos.

Penso em Macau e em S. Tomé e Príncipe como países em que tudo está calmo, tudo está bem, porque não têm casos e em Angola, porque tem poucos e controlados.

Mas nada está bem.
Também há medo e incertezas, muitas vezes silenciosas. 
A chegada de um avião é vista com temor, as importações assustam, turistas nem pensar. 
Tal como as famílias, os países quererão ficar fechados e isolados, livres de mais perigos, para não arriscarem novas vítimas e, desta forma, só a vida individual vai sobreviver e a prazo.

Claro que acredito que aparecerão medicamentos eficazes, tal como antevejo que, mesmo assim, nada se resolverá, no mundo, sem que passem vários anos. 
Teremos de entender e estarmos preparados.