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sábado, 28 de março de 2020

Os GE's..., por Paulo Lopes


Os GE's


São, sem qualquer espécie de dúvida, os que mais conhecem e sabem desta guerra de guerrilha.

Sabem “farejar” à distância a proximidade do IN.
Sabem quando e como se devem proteger de possíveis ataques de morteiros.
Sabem compreender o terreno que pisam.
Trazem nos seus sentidos todos os diferentes cheiros e ruídos que atravessam a densa floresta e reconhecem os seus efeitos.
Sabem prever o imprevisto que nos traz num alerta constante.
Sabem, sobretudo, ter o sentido da oportunidade.

E tudo isto não foi aprendido em instruções militares dadas num quartel militar.
É fruto da experiência do dia-a-dia ganha no seu habitat natural, pois não fossem todos eles filhos da floresta e alguns mesmo e em larga escala, refugiados da Frelimo.

Nada destas experiências se aprende na instrução militar obtida nos nossos quartéis de Portugal Continental.



Sabemos o que é uma granada e o que temos de fazer com ela.
Treinámos os movimentos que se consideravam correctos para as diversas situações, de ataque ou defesa.
Aprendemos a manejar as armas que tínhamos e até as que nunca tivemos no Ultramar.
Muito minimamente prepararam-nos fisicamente para grandes desgastes.
Mentalizaram-nos que íamos matar para nos defendermos dos ataques. Tentaram lavar-nos o cérebro.
Mas nada, ou quase nada, do que nos foi impingido em toda essa aprendizagem relâmpago, serviria para colocar em prática na realidade da guerra.

Nunca nos foi ensinado nem nunca o poderiam fazer, porque para esta guerra que obrigatoriamente viemos e para todas as guerras, é preciso existir convicção nos actos e certeza de que estamos a agir para uma causa comum e isso, nenhum dos fazedores dos livros que ensinam a guerra conseguiram globalmente fazer ou ensinar porque a guerra não era nossa, nunca sentimos interiormente que estávamos a lutar por uma causa justa, apenas lutávamos para nos defendermos a nós próprios e quando isso era necessário.



No nosso espírito apenas pairava a enorme vontade de chegar ao fim da nossa obrigatória missão porque não era difícil, nem aos mais distraídos, compreender que tudo o que nos estavam a fazer sofrer não passava duma enorme mentira, aprofundada pelos poderosos que queriam forçosamente manter as colónias para promoverem as suas próprias fortunas à custa dum “batalhão” de escravos que trabalhavam nas suas enormes propriedades, adquiridas sabe-se lá como nem a quem.

Animais que apenas viviam para todas as suas prepotências e vaidades.
Bestas que conseguiam manter e engordar as suas fortunas a seu belo-prazer. Era para isso que nós estávamos na guerra: para defender o pecúlio desses senhores poderosamente abastados ou abastadamente poderosos.

Por isso, mesmo inconscientemente, nunca aprofundámos a nossa maneira de combater de forma a conseguirmos uma vitória e sempre o fizemos apenas para nossa própria defesa.
Essa defesa que não nos ensinaram porque quem ensinava desconhecia a verdadeira guerra, o verdadeiro terreno.

Isso, quem sabia e creio que também e essencialmente para defenderem a própria pele, era quem sempre viveu e lutou no mato: os GE.

In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
Paulo Lopes.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Visita do Capelão, por Paulo Lopes

 
Paulo Lopes - 28 de Janeiro de 2014 16:29 

Nesta Quarta-feira, vindo no táxi aéreo, tivemos a visita de um companheiro de exército, mas julgo eu, fora do contexto de guerra: um capitão, mas de uma arma totalmente adversa a esta zona e mais propicia a outras paragens: o capelão!...
Vinha com uma missão deveras difícil de cumprir:

— Purificar os pecadores.
— Salvar as almas.
— Abençoar as armas (???).

Decerto que a ideia deste capitão capelão, não era de nos incutir mais eficácia nos combates ou frieza nos corações para matar, mas sim dar-nos algum conforto de espírito, pois, apesar de tudo, ainda havia quem acreditasse nas palavras deles —padres— e talvez, quase todos tivessem fé em qualquer coisa.
 
Só ele sabe qual a razão da sua primeira e única visita a este seu rebanho deixado ao acaso no meio do nada, para lá do fim da linha.
 
Infelizmente, para estas almas penadas, o capelão não trouxe o milagre do fim da guerra. 

Mal ficámos apresentados ao nosso pastor e já estávamos com outra mensagem em cima da mesa do capitão —este doutra Bíblia— a discutir os inevitáveis preparativos para mais uma operação.

Entretanto fomos dando dois dedos de conversa com o capitão capelão.
Dava perfeitamente para entender que era um homem de não tiranizar ninguém, nem tão pouco apresentar a força divina com a sua força de galões de capitão.
Tinha uma candura ingénua de jovem eclesiástico não tendo, no entanto, a boca constantemente cheia de milagres.

Sabia bem o que estava a fazer e qual a sua missão: era apenas um pastor de ovelhas fardadas e sabia que, naquele local de cheiro a guerra, nem todos acreditavam nas suas palavras.

Eu, pelo que me diz respeito, apenas ponho em causa o seguinte e que não consigo compreender muito bem: se do outro lado da guerra, dos que teimosamente tinham o cognome de turras, existe outro qualquer padre, pedindo ao mesmo Deus exatamente a mesma proteção para os seus homens, como é que o bom Deus iria resolver esta questão?
Que lado ele defenderá?
Que homens mereciam a sua salvação?
Será que conseguira terminar o conflito entre as partes terrestres?
Pelo menos, até agora, não conseguiu por termo à ganância dos poderosos que, aliás, a grande maioria deles, se não todos, são muito dados a essas bênçãos do Céu, quando mostram o lado falso da sua face oferecendo este mundo e o outro aos altos eclesiásticos!
 
Será que até ao bom Deus eles conseguem enganar?
E lá fomos conversando.
Laracha daqui, laracha dali, até que veio a ordem para inicio da festa.

paulo lopes
in"Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"