Devidamente autorizado e para que não constasse o meu nome em qualquer escala de serviço, até porque estava apenas em transito e à espera de guia de marcha para seguir o meu destino, hospedei-me em casa dos meus amigos, tendo que fazer uma visita diária ao quartel para saber da minha viagem até Mataca.
Ainda estive vinte e oito dias em Porto Amélia, os quais foram utilizados da melhor maneira possível, fazendo de tudo e de todos um escape para a ideia atormentadora de que se aproximava a derradeira epopeia para a qual servia a minha presença nesta terra tão distante da minha e que nada me dizia.
Estava na esplanada do Hotel Cabo Delgado desfrutando o prazer de beber uma fresca cerveja para acalmar o estalar na pele do quente sol africano, quando um dos amigos do casal que me dava guarida e que já me tinha sido apresentado, e até já confraternizando numa ou noutra conversa, interrompeu esse prazer: — É pá, vai ao Sector para te entregarem a guia de marcha.
O interlocutor nem me deixou pestanejar e prosseguiu com a sua informação em primeira-mão: segues amanhã comigo para a Mataca.
Fiz-lhe sinal com a cabeça para ele se sentar e acompanhar-me numa bebida.
Aceitou e enquanto puxava pela cadeira continuou a sua prelecção: — Em vez de ires em coluna de Porto Amélia para Macomia, o que já é mau, e depois ficares lá à espera doutra coluna que te leve para Mataca, o que ainda é muito pior, vais comigo de avião directo a Mataca.
Este meu recente amigo era um piloto de aviões ligeiros, mais conhecidos por Táxis Aéreos, os quais eram fretados pelo exército para fazerem varias distribuições pelos diversos postos militares espalhados por todo o Distrito.
Acabámos a nossa desinteressante conversa no ultimo gole de cerveja e fui cumprir o meu dever de militar.
Feitas as respectivas diligencias no quartel de Porto Amélia estava, no dia seguinte, a despedir-me do casal meu conhecido e pronto para descolar asas até ao meu próximo destino, aproveitando a boleia de avião em vez de fazer as tais colunas de tão má reputação mas que eu, desconhecedor das realidades, não fazia a mínima ideia do que eram.
paulo lopes
in "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
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