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sexta-feira, 14 de abril de 2017

A minha música nos idos anos de 60/70, por Paulo Lopes


Paulo Lopes 


Boa tarde minha querida amiga Maria Faria.



A musica é e sempre será um universo de sensações dispares cujos gostos se alternam em extremidades que, ao contrário de outras, são impossíveis de se tocarem. 

Isto porque, quem adora num sentido extremo o rock, decerto detesta o pimba! 
Por isso ser-lhe-á muito complicado chegar a um consenso em relação à matéria que se propôs criar em trabalho. 

Mas lá vai a minha fraca e humilde participação: para mim será muito complicado afirmar que este ou aquele tema deste ou daquele grupo ou individuo me marcou a mente porque o que me marcou e marca é a própria musica. 

Em relação ao que se ouvia quando estávamos na guerra, também não lhe vou adiantar nada porque, na Mataca, completamente isolados, o que se ouvia era musica que passava na rádio e essa, muito sinceramente, se a ouvia era apenas som que entrava num lado e saía do outro sem ficar absolutamente nada porque, o que se ouvia, canção sim, canção não, era Roberto Carlos e outros iguais cujos nomes agora me escapam. 

Agora, se recuarmos um pouco o tempo, o antes da Mataca e ainda em Lisboa mas já numa fase de pré-guerra, aí poderei já, efectivamente dizer o que ouvia e o que ouvia baseava-se muito no rock; jazz; blues; country e baladas de intervenção (mas não significa que não ouvisse, com interesse, outras coisas). 
Dizia eu num pretenso livro que rascunhei e cujo conteúdo já foram passados aqui alguns (demasiados para alguns) trechos mas que este tema torna viável recordar mais este e que talvez sirva para a sua tese:
..................................
"E assim ia eu passando a minha certinha vida, pobrete mas alegrete, entre o escritório duma concessão de automóveisda marca Opel (onde o Eusébio, mítico jogador de futebol sobejamente conhecido, achado num clube desportivo de Moçambique e arrancado ao eminente pé descalço, foi comprar um carro ou disso fez intenção) e as aulas, intercaladas com
umas fitas nos cinemas Imperio; Imperial; Avis; Odeon; Politeama; Max e outros. 



Uns mais para a fineza outros mais para o piolho (nunca disso fazendo grande distinção), misturando pelo meio umas passagens na Portugália dando umas tacadas nas bolas de snooker ou, de estilo mais emproado, num bilhar às três tabelas, preocupando-me muito mais com a mesa onde permanecia uma travessa de batatas fritas com mostarda e na imperial que estava a perder a pressão, do que propriamente na pontuação que ia obtendo no combate bilharesco, nunca descurando, quando possível, uma paragem no Parque Mayer, colando os ouvidos a uma maquina de discos (invenção americana dos anos cinquenta, creio eu) metendo uma moedinha, percorrendo com os dedos e olhos o numero e letra que dava acesso ao que queríamos ouvir: Everly Brothers; Tremeloes; Chuck Berry; Kinks; Byrds; Crispian St. Peters; The Walker Brothers; Procol Harum; Jimi Hendrix; Scott Mackenzie; Manfred Man; The Move não esquecendo claro está, The Beatles ou, noutro estilo de rock, The Rolling Stones, não variando as composições porque os vinis eram inevitavelmente os mesmos, viro-disco-e-toco-mesmo, sempre com a esperança de um dia, com um pouco de sorte, pudesse chegar ao luxo de ter uma aparelhagem e discos próprios em casa (coisa que só alguns, muito poucos, a isso tinham acesso)."


......................................

Creio que este trecho já diz um pouco sobre a sua pergunta mas, ainda faltam muitos que me marcaram e que poderei mencionar como, por exemplo: Bob Dylan; Donovan; Tem Yerars After; Credence Clearwater Revival; Simon & Garfunkel; Steve Miller Band; Barclay James Harvest e muitos outros que a década dos nossos dourados anos criou.

Agora perguntará a Maria Faria: "E Portugueses?"

E eu repondo: o inevitável Zeca Afonso (que me desiludiu muito depois da revolução por se ter "vendido" ao partidarismo cego): Fernando Lopes-Graça; António Pinho Vargas; José Mário Branco e outros que, na altura da guerra pouco ou nada era ouvidos pelas razões óbvias.

E pronto. 


Desculpa esta longa resposta ao pedido mas o culpado foi o Luís Leote ao dizer que eu seria a pessoa indicada para tal informação o que, pelo descrito, é totalmente errado porque o que eu ouvia e gostava, não era, de forma alguma, o comum dos tempos de guerra! 

Mas, dos outros, eles que se prenunciem! Apenas falo por mim e pelos meus gostos musicais.

Um beijo.
Paulo Lopes

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Sonhos recorrentes..., por Armando Guterres


Da minha parte, afirmo que o Picadas e o Batalhão Cavalaria 3878 me levaram a retificar algumas das coisas em que eu próprio participei.


Nunca tive pesadelos, mas sonhos recorrentes. 
Um deles sobre os últimos dias na Mataca, antes da rendição.



Principalmente a seguir ao arame farpado do lado do aldeamento era tudo muito alterado ou com grande ribanceira ou um monte e a Frelimo sempre por ali. 

Eu sempre à procura da roupa e dos sapatos, que a arma estava junto à cama ou no ab...rigo, da minha secção, que ia mudando de sítio e formato. 

Os carros formados para arrancar (naturalmente baseado na chegada em Fev 72 e muito longe do regresso em Março de 74). 

Os sonhos uns sem tiros e outros havia, sempre sem consequências. 

{Altura para acordar e fechar o sonho}. 

Isto anos. 

A realidade: os últimos dois meses estive na ponte Muacamula - Macomia. 


Portanto, recebi os checas na ponte. .

domingo, 8 de janeiro de 2017

Na apanha do caju I, por Paulo Lopes


Paulo Lopes

Eu relembro:

No dia seguinte e como já estava mais ou menos previsto, fomos proteger os trabalhadores na apanha do caju.

Uma das varias fontes de receita para engordar contas bancárias de uma meia dúzia de abutres e claro, untar as mãos dos
 energúmenos brigadeiros, coronéis, marechais e outros que tais que estão a mais! (mentira!! Estou a brincar!!!).

Mas quem ia proteger essa receita?
Nós, pois então!

E quem a iria apanhar a troco de quase nada?
Os nativos, claro e transparente como a brisa que sopra nas tardes limpas do calor de África!
Durou dois dias esta primeira intervenção do meu grupo de combate.
Entretanto, quando outro grupo prosseguia na proteção nos campos de cajueiros e o nosso descansava no quartel de Macomia, como era eu que comandava o grupo, fui chamado ao gabinete do major.

Aqui já tinha que ter cuidado com os passos em frente, continências, farda devidamente apresentável e todas essas coisas que chamavam de disciplina militar que na recruta me ensinaram e obrigaram-me depois, mais tarde, a ensinar a outros.


E foi assim que me apresentei ao terror das operações.


Sem muita conversa paralela, o nosso major foi direitinho ao assunto e ao mesmo tempo que me mostrava no mapa uma zona determinada, ia dizendo:
— Assim que anoitecer, quero que o seu grupo saia para um patrulhamento.
Seguem por esta picada —movimentando o seu ponteiro pelo risco desenhado no mapa que nos indicava o caminho— até ao Sagal e assim que o atingirem entram na floresta até chegarem aqui — e o ponteiro parou na picada que vinha do Chai —.

Pretendo que dentro da floresta avancem ziguezagueando no terreno e em zonas mais densas façam emboscadas nos trilhos que possam encontrar.
Possivelmente e num andamento normal, chegarão perto das nove horas da manhã.


Assim que chegarem ao objectivo comuniquem para que eu mande uma viatura buscá-los. 
Compreendido?
— Muito bem meu major.
Peguei no mapa e retirei-me, sem que, militaristamente, fizesse a respectiva continência.


Claro que ele tinha uns planos muito bem definidos e estudados, mas falhou num ponto essencial: era eu que ia a comandar o patrulhamento e não ele (como é óbvio!).


Saímos às cinco horas da tarde e rigorosamente cumpri as ordens recebidas indo direitinho pela picada prevista ate ao Sagal.

Uma aldeola como tantas outras plantada uns quilómetros (poucos) afastada do quartel e que albergava uma mão cheia de nativos entre eles, decerto alguns do inimigo, que vegetavam por meia dúzia de palhotas de construção igual a todas as outras.


Mas a partir dai alterei todo o planeamento do meu querido major: não andei toda a noite as voltinhas.
Não embosquei absolutamente nada.
Não aproveitei o luar para coisa alguma a não ser para escolher o melhor local possível para estender os ossos.

Tenho a certeza de que, por muito razoável que fosse esse local, nunca se aproximaria à boa cama onde o major se iria deitar e sonhar a maneira de inventar operações para os seus soldadinhos de chumbo fazerem.

Mal acabamos de sair do Sagal e já dentro da mata, mandei formar o circulo habitual para as pernoitas e a única coisa que exigi foi a montagem de um esquema de sentinela e o silêncio quase absoluto, não fossemos acordar as diversificadas aves que já se acomodavam cobertas pela folhagem das árvores que as albergavam.

Ninguém nos chateou, nem incomodámos ninguém e por volta das cinco horas da manhã iniciámos o caminho até ao local previsto para a nossa recolha, o qual atingimos cerca das sete horas.
Claro que apenas às nove horas — de maneira nenhuma queria estragar as contas feitas pelo major!— comuniquei com Macomia informando a nossa chegada ao local combinado.

Entretanto ia escrevendo o guião para o filme que apresentaria ao major.
Fomos recolhidos duas horas mais tarde que a prevista, mas vieram.
Francamente, pensei que não o fariam e que o nosso regresso a Macomia teria de ser feito a pé.

In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
paulo lopes

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Mais poemas, por Paulo Lopes

Paulo Lopes 
Amigo Rui Briote
Foi, é e será isto o mundo que me faz pensar
  • POR TI ME FAZ PENSAR

    Desobediente floresce
    na claridade negra
    de uma análise interna.

    A realidade

    E a culpa recaída
    sobre a cabeça de ninguém
    revolta as veias paradas
    no seio da distância
    que por ti me faz pensar.
  • Eis-me aqui a assistir
    à interior evolução
    do poema

    Desde não sei quando aqui cheguei
    a minha luta se trava
    em batalhas de semântica

    Para aqui vim por cá fiquei
    habito a terra
    e fui semente

    Colono a desvendar esta floresta
    de dúvidas - vou habitando
    o sonho que me mente

    domingo, 13 de novembro de 2016

    Estás mobilizado Lopes..., por Paulo Lopes


    a
    Comentários



    E no meio desses azares todos, longe, muito longe, estava eu descansado, como quase sempre:

    ...Foi num dos momentos de lazer, quando esperávamos quórum suficiente para mais uma tarde de jogo de futebol de 5, que o Comandante da Companhia, também ele apreciador de um bom jogo de futebol ou de qualquer outra actividade desportiva que metesse bola, chegou para aumentar o numero que fosse o ideal para iniciar a partida e me informou, com simples palavras calmas e duma frieza extrema sem transparecer qualquer hesitação no discurso de parcas palavras e sem nenhuns rodeios, colocando o braço sobre o meu ombro, num semi-abraço:
    — Estás mobilizado Lopes. Vais para Moçambique...

    Formou-se um silêncio longo e escuro que me abraçou suavemente. 

    Um abraço com a duração de um instante parecendo-me uma vida. Vida que nesse momento me colocou em solidão, adormecido no tempo e no local, esquecido do presente, transportando-me para outro mundo, desconhecido no meu horizonte. 

    Acordou-me a bola que bateu perto de mim...
    Por estranho que pareça, não deixei de, briosamente, defender a baliza que estava à minha guarda e creio que nem o capitão o autorizaria e afinal, nada estava a acontecer que estivesse a fugir à normalidade. 

    Apenas mais um seguiria para o Ultramar. 
    Mais um número para informar o quartel de Adidos, em Lisboa, na Ajuda, para prepararem a partida. 

    Afinal, o que perdiam ali no quartel de Beja era apenas o guarda-redes da equipa de futebol de 5 e não havia outro. 

    Tinham de pensar em arranjar. 
    Que chatice... 

    Depois da missão desportiva cumprida e banho tomado, vestido como um militar, lá fui eu à secretaria saber mais pormenorizadamente do meu futuro, militarmente falando.
    ...
    In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
    paulo lopes

    domingo, 6 de novembro de 2016

    Mataca, onde é que isso fica..., por Paulo Lopes





    Aproveito para dizer que a única parte que jeito tenha do texto que o amigo Jose Capitao Pardal relembrou aqui, é o que não existia: as fotos!

    Obrigado Pardal só que, com isso e ao ver o campo de futebol de Porto Amélia, fez com que volte a incomodar a
    s hostes com mais umas palavrinhas do dito livro (que o não é):

    Na Beira, depois daquelas burocracias habituais e extremamente aborrecidas de fazer, soube quando partiria para Porto Amelia, no distrito de Cabo Delgado.



    Para mim, completamente desinformado da geografia Africana, tal nome nada me dizia, mas como o mal logo se sabe, fiquei esclarecido e para que constasse, Cabo Delgado era um dos principais distritos do norte de Moçambique onde a guerra estava bem implantada.
    Começava a acordar de vez!
    Mas que poderia esperar um atirador?

    Três dias depois, aterrava no Aeroporto de Porto Amelia, capital do distrito de Cabo Delgado.

    Entre apresentações e avisos do que havia a fazer, depressa fiquei conhecedor do meu pouso definitivo: — MATACA, junto à Serra do Mapé.



    Restava-me saber quando e como iria.
    Ninguém me deu agradáveis noticias de tal paradeiro: Uns não conheciam tão pouco Mataca mas da dita Serra, não me auguravam nada de aceitável.
    Outros diziam que era no meio do nada e simplesmente faziam uma careta expelindo dos seus lábios um enorme "chiiiiiiii", alguns, os mais conformados, diziam que era igual a tantos outros aquartelamentos espalhados pelas matas de Cabo Delgado.
    Fiquei a saber o que já sabia...nada!

    Vinha munido da morada de uma amiga que morava em Lisboa precisamente na minha rua e que tinha vindo procurar vida nova exactamente para Porto Amélia.
    E então, assim que me vi livre dos meus deveres militares, tal provinciano chegado a uma grande cidade, sem conhecer nada nem ninguém, ai fui eu a procura do paradeiro da minha amiga de infância.

    Felizmente para mim, Porto Amélia não era nenhuma grande cidade (até bem pequena) e foi fácil localizar o destino a que me propus.

    Ela era professora no liceu de Porto Amélia e ele, o marido, além de trabalhar na fabrica de cerveja, treinava a equipa de basquetebol da terra e, talvez por isso, estava bem relacionado com civis e algumas altas patentes militares a quem me foi apresentando aos poucos.

    Através dele, fui fazer um treino de captação na equipa de futebol de Porto Amelia, com o alento despoletado por falsa esperança vinda do marido da minha amiga, que isso me levasse a ficar por lá.



    De todo impossível!
    As cunhas não funcionaram, o que não era de estranhar, e como eu não apresentava assim tanto jeito para dar uns pontapés na bola que desse uma mais-valia a equipa da terra... tinha mesmo de ir para as trincheiras da guerra.





    ........
    In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
    paulo lopes