sábado, 28 de março de 2020

QUEM ESTEVE NA MATACA PARA APANHAR O PULSO..., por Paulo Lopes

QUEM ESTEVE NA MATACA PARA APANHAR O PULSO.
===================
TEXTO DE PAULO LOPES.
===================

Este post do amigo e sempre presente Rui Briote, levou-me a procurar uma passagem pelas terras da Serra de Mapé onde tive a oportunidade de "olhar" bem para as estrelas. 



E aproveitei também para "calar" o Sr. Duarte Pereira em relação a que já há muito que não se publica nada sobre a guerra! Então vai daí e sabendo que poucos vão ter a paciência de mais um meu longo texto, tomem lá que é de borla e fresquinho!!   




Já se vinha comentando desde algum tempo a necessidade de proceder a algumas reparações na picada que nos ligava a Macomia, já que nalguns pontos se tornava quase impossível transpor com as Mercedes 404 sendo necessário, diversas vezes, a utilização do guincho incorporado nessas mesmas viaturas para se conseguir a deslocação na subida da serra, porque a picada estava de tal forma desnivelada e esburacada que punha em risco a progressão da coluna com um provável "capotanço" de um ou mais carros se estes não fossem conduzidos com a máxima perícia, muita coragem e perseverança dos condutores que, para além de terem que conduzir com a máxima atenção, tinham também a tarefa de estarem atentos a possíveis emboscadas já que estes eram os que mais alto iam e por isso alvos mais fáceis. 

Tudo isto se embrulhava nos seus cérebros adicionando a forte hipótese de saltarem do banco, sem serem eles a fazer por isso, se porventura fizessem accionar uma mina anti-carro! 
Urgia tratar desse efectivo problema para não se correr o risco de ficarmos sem reabastecimento de mantimentos já que sem esta picada minimamente funcional só os poderíamos ter de pára-quedas ou de alguns voos de helicóptero o que eu ponho muito em dúvida que tal fosse autorizado ou realizado! 
Foi dada a autorização necessária para essa reparação. 
Este género de trabalhos era efectuado com o auxílio de civis que para tal eram recrutados. 
Claro que só poderiam efectivar esse trabalho com a nossa protecção visto que se o fizessem sozinhos não estariam lá um só dia. 

Seriam logo atacados, capturados e reencaminhados para as machambas ou recrutados para as fileiras de guerrilheiros da Frelimo. 
O meu grupo foi o primeiro a fazer essa protecção e coube-me a mim, para lá da protecção, orientar também os trabalhos, qual capataz de obras. 

Iniciou-se a reparação a partir do cimo da Serra de Mapé, indo encosta abaixo. 
Daquele local tínhamos acesso a uma visão global da extensa e interminável floresta. 
Já tinha passado muitas vezes por aquele mesmo caminho, mas as circunstâncias nunca eram propícias à apreciação da real beleza das paisagens que aquela serra nos proporcionava e que, não fosse o constante alerta para os possíveis embates, nos daria uma enorme paz de espírito. 

Tinha agora uma forte hipótese de apreciação a tão agradável e deslumbrante visionamento que não descurei e aproveitei da melhor forma até iniciarmos a descida serra a baixo: a verdade da pura natureza!
Um mar de arvoredo espesso e verdejante salpicado aqui e ali por outra cor tirando o uniforme tom, como que a obrigar a nossa visão a fixar-se naqueles pontos que brotavam fora do contexto primordial. Mar calmo como a serenidade duma baía que se prolongava num horizonte sem limite na nossa observação. 
Podia dar asas à imaginação e descobrir uma embarcação flutuando na ondulante folhagem de movimentos lentos e incertos proporcionados pela leve brisa do vento, originando um suave murmúrio entrando no peito desvanecendo-se instantaneamente em calma e transportar-nos para lado nenhum. 
Os homens iam descendo a encosta da serra pela picada desbravando terra de um lado para tapar buracos no outro. 

Nós íamos patrulhando os laterais, protegendo os trabalhadores. 
Quanto mais íamos descendo maiores eram as dificuldades de arranjo. 
As ferramentas de trabalho que aqueles trinta homens recrutados possuíam para realizar aquela tarefa restringiam-se a módicas catanas, picaretas, pás e uma boa dose de pouca vontade de cavar ― proporcional ao pagamento que iriam auferir ―. Com este tipo de ferramenta adicionado à inexistente competência dos construtores de estradas recrutados à população nativa —não esquecendo o capataz, ou seja, eu— pouco, para não afirmar que mesmo nada iria beneficiar esta única forma de nos deslocarmos com as viaturas: revolvia-se a terra de um lado para a colocar em buracos mais profundos. Desbastava-se mato e arvoredo. 
Tentava-se nivelar o máximo possível o rodado de passagem mas, olhando depois para o que ia ficando para trás dos trabalhos, não se visionava grande alteração deixando antever que tudo ficaria igual assim que a próxima chuvada fizesse desencadear uma avalanche de água serra abaixo. 

Por uma questão de segurança, quando chegou o fim de tarde, regressámos ao cimo da serra para pernoitarmos. 
Montado todo o habitual mas sempre alertado esquema de segurança, de cama preparada, quando a escuridão da noite misturava a infindável floresta com o firmamento e as estrelas brilhavam num turbilhão de vida e encanto, pude vislumbrar toda a visão nocturna que podíamos observar daquele local privilegiado da serra. 
Paisagem que eu, citadino lisboeta dos sete costados, onde até a simples estrela polar se torna complicado descobrir quando é escondida pela altura do betão armado, nunca tinha oportunidade de desfrutar nem mesmo na Serra de Sintra ou no perto Monsanto. 

De luzes artificiais, apenas, muito ao longe, as luzes dos focos do nosso estacionamento virados para o lado de fora do arame farpado. 
Lá estava a nossa casa: Mataca. 

Tudo o mais era natural: Estrelas, muitas e deslumbrantes estrelas. 
Silêncio, absoluto silêncio que nos permitia ouvir a respiração dos já adormecidos e o abanar da folhagem das árvores mais altas que uma leve e suave brisa proporcionava. 
Fiquei algum tempo a observar o espaço, desviando por vezes o olhar para os pontos de luz que, lá longe, na Mataca, salpicavam a escuridão que se encontrava por baixo das brilhantes estrelas, como se alguém tivesse pintado umas pequenas pinceladas de amarelo num enorme fundo, agora tornado negro. Deitei-me na minha improvisada cama de capim a pensar: Como isto tudo poderia ser ainda mais belo se eu não estivesse de braços apoiados no carregador da minha G3,

In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
paulo lopes

Os GE's..., por Paulo Lopes


Os GE's


São, sem qualquer espécie de dúvida, os que mais conhecem e sabem desta guerra de guerrilha.

Sabem “farejar” à distância a proximidade do IN.
Sabem quando e como se devem proteger de possíveis ataques de morteiros.
Sabem compreender o terreno que pisam.
Trazem nos seus sentidos todos os diferentes cheiros e ruídos que atravessam a densa floresta e reconhecem os seus efeitos.
Sabem prever o imprevisto que nos traz num alerta constante.
Sabem, sobretudo, ter o sentido da oportunidade.

E tudo isto não foi aprendido em instruções militares dadas num quartel militar.
É fruto da experiência do dia-a-dia ganha no seu habitat natural, pois não fossem todos eles filhos da floresta e alguns mesmo e em larga escala, refugiados da Frelimo.

Nada destas experiências se aprende na instrução militar obtida nos nossos quartéis de Portugal Continental.



Sabemos o que é uma granada e o que temos de fazer com ela.
Treinámos os movimentos que se consideravam correctos para as diversas situações, de ataque ou defesa.
Aprendemos a manejar as armas que tínhamos e até as que nunca tivemos no Ultramar.
Muito minimamente prepararam-nos fisicamente para grandes desgastes.
Mentalizaram-nos que íamos matar para nos defendermos dos ataques. Tentaram lavar-nos o cérebro.
Mas nada, ou quase nada, do que nos foi impingido em toda essa aprendizagem relâmpago, serviria para colocar em prática na realidade da guerra.

Nunca nos foi ensinado nem nunca o poderiam fazer, porque para esta guerra que obrigatoriamente viemos e para todas as guerras, é preciso existir convicção nos actos e certeza de que estamos a agir para uma causa comum e isso, nenhum dos fazedores dos livros que ensinam a guerra conseguiram globalmente fazer ou ensinar porque a guerra não era nossa, nunca sentimos interiormente que estávamos a lutar por uma causa justa, apenas lutávamos para nos defendermos a nós próprios e quando isso era necessário.



No nosso espírito apenas pairava a enorme vontade de chegar ao fim da nossa obrigatória missão porque não era difícil, nem aos mais distraídos, compreender que tudo o que nos estavam a fazer sofrer não passava duma enorme mentira, aprofundada pelos poderosos que queriam forçosamente manter as colónias para promoverem as suas próprias fortunas à custa dum “batalhão” de escravos que trabalhavam nas suas enormes propriedades, adquiridas sabe-se lá como nem a quem.

Animais que apenas viviam para todas as suas prepotências e vaidades.
Bestas que conseguiam manter e engordar as suas fortunas a seu belo-prazer. Era para isso que nós estávamos na guerra: para defender o pecúlio desses senhores poderosamente abastados ou abastadamente poderosos.

Por isso, mesmo inconscientemente, nunca aprofundámos a nossa maneira de combater de forma a conseguirmos uma vitória e sempre o fizemos apenas para nossa própria defesa.
Essa defesa que não nos ensinaram porque quem ensinava desconhecia a verdadeira guerra, o verdadeiro terreno.

Isso, quem sabia e creio que também e essencialmente para defenderem a própria pele, era quem sempre viveu e lutou no mato: os GE.

In "Memórias dos Anos Perdidos ou a Verdade dos Heróis"
Paulo Lopes.

Recruta no destacamento da EPC em Santarém, por Livre Pensador

Livre Pensador
26/03/2020

Bom dia para todos.

Quem de nós passou pela recruta no destacamento da Escola Prática de Cavalaria em Santarém, decerto que se lembra dum dos habituais exercícios praticados na instrução e que era dos mais temidos por nós instruendos. 





Dava pelo nome de "PATRULHA FANTASMA", e lá chegou o dia em que tive de a fazer. 


Numa certa noite entrámos em camiões completamente fechados, e saímos do quartel. 
A princípio ainda tentei perceber qual o rumo que o camião levava, mas pouco depois fiquei desnorteado.

Depois de muito andarmos chegámos ao meio dum monte qualquer. 

Cada pelotão de 30 homens foi dividido em patrulhas de 10 elementos, e a cada uma delas era dada ordem para iniciar um percurso que estava sinalizado. 

Pouco ou nada se via. 
Surgiam vários obstáculos que era preciso ultrapassar como, subir por redes, subir a árvores, rastejar por baixo de arame farpado, rebentamento de granadas, muitos tiros, etc, etc,. 

Cada pouco éramos deitados ao chão, ora por sacos cheios de areia que, suspensos de uma árvore eram atirados contra nós, ora por paus com uma luva de boxe na extremidade que nos batia na cabeça, instrumentos esses "telecomandados" pelos nossos instrutores. 

Nunca levei tanta porrada como naquela noite. 

Quando chegámos ao fim do percurso um dos instrutores deu-nos a seguinte informação: vocês acabam de conseguir fugir dum campo de concentração, mas têm de chegar a Santarém sem serem vistos. 
Temos vários instrutores espalhados pelo caminho. 

Se forem localizados não vão de fim de semana a casa!!! 
A minha patrulha tentou, em primeiro lugar, perceber onde estava. 
Era impossível naquela noite escura. 

Resolvemos começar a descer o monte andando um pouco à toa, como é costume dizer. 

A certa altura encontrámos um pequeno riacho. Talvez fosse uma ajuda e decidimos seguir o curso da água pensando que fosse dar a algum rio. 

Depois de muito tempo a acompanhar o riacho, eis que nos surgiu a linha de comboio Lisboa-Porto. 
Era preciso tentar descobrir a nossa localização relativamente a essa linha. 
Olhámos para o nosso lado esquerdo e só víamos linha. 
Olhámos para a direita e, lá muito ao longe, vislumbrámos um clarão num alto. 
Era, sem dúvida, a iluminação da cidade de Santarém. 
Estava encontrada a nossa localização, algures na linha do Norte entre o Entroncamento e Santarém. 

A partir daí, tudo se tornou mais fácil. 
Foi só continuar pela linha até chegarmos à estação de Santarém. 

Pelo caminho iam surgindo alguns laranjais, onde íamos matando a fome e a sede. 

Chegámos ao quartel entre as 5 e as 6 da manhã sem termos sido detectados por quem nos queria roubar o fim de semana tão desejado!

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

O Pacheco morreu..., por Rui Brandão

Há dias que não deviam existir. 

Cheguei hoje de férias e fui dar uma "voltinha" no "face" do Batalhão. 
Tal não é o meu espanto quando leio a notícia do Fernando Silva António. 
O Pacheco morreu há 3 anos.



Não estou, ou continuo a não estar preparado para este tipo de notícias no que diz respeito àqueles que comigo partilharam o dia a dia em Macomia. 
Não é mesmo nada fácil para mim.

Pacheco!!! não tiveste o "músculo" para te aguentares com um desgosto de Amor. 
Entregaste a tua vida ao alcoolismo. 
Ok, foi uma escolha...
Recuperaste eu sei. 
Mas a procura de um suicídio lento foi o caminho que inclusivamente te levou a evitar os companheiros de Guerra que te iam procurando. 
Não te censuro. 
Os amigos para além de outras coisas, servem para compreender. 
Foste embora mais cedo. 
Não interessa. 
Continuarei a procurar-te nas minhas memórias onde aparece a tua frontalidade, a nobreza, a pureza da maneira de ser e estar e a constante procura de partilha. 
Foste um exemplo para todos nós, em como um homem deve estar com amigos. 
Deixa-me publicar as tuas frases que fizeram História numa companhia C.C.S que entre 1972 e 1974 permaneceu em Macomia.


Quando alguém casava... Disparavas. 
Putas as mesmas, cabrões mais um!!!
Quando recebias as encomendazitas dos teus Pais do Algarve... 
Desabafavas. 
A puta da velha, em vez de mandar uma garrafa de medronho, só manda bolos de amêndoa.
Quando arrancávamos para as nossas costumadas patuscadas... 
Desafiavas. 
Morra quem se negue!!!



Quando fomos violentamente atacados à morteirada, saíste debaixo de fogo do abrigo e correste para a fogueira da cozinha da messe de Sargentos para retirar o tacho do lume de uma valente caldeirada de línguas de bacalhau... 
E vociferaste. 
Estes filhos da puta (frelimos) ainda me deixam queimar as línguas de bacalhau !!!
Quando me viste pela primeira vez a "carecada" com que fiquei assim que cheguei a Macomia... Gritaste.
Caralho!!!
Pareces o menino Carlinhos!!!
Assim fiquei com a alcunha do menino Carlinhos.



Quando nasceu o meu 2º filho, já tínhamos rodado para Ribaué, perto de Nampula. 
Pus-lhe um nome fictício - Momade Issufo - . 
Tu foste designado por mim como o padrinho do puto. 
Assim aconteceu. 

Quando chegámos a Lisboa, estiveste presente no "batizado" e ficaste o padrinho do Nuno Miguel.
Que mais podemos ter Pacheco? 
Nada, não queremos ter mais nada. 
A nossa amizade chega, mesmo em "suporte" de memória. 
Fica bem meu companheiro Furriel Miliciano Cripto.

domingo, 2 de fevereiro de 2020

Descida da Serra do MAPÉ..., por José D'Abranches Leitão

Esta foto faz-me recordar! (Sou eu mesmo ao lado do condutor )
Nota: esta foto saiu numa crónica/memória minha no CM...sobre a guerra colonial!
A jornalista agora "usa-a"...para o artigo dos milhões que Portugal gastou na dita guerra...
Mais eis o que recordo...e que escrevi em tempos.

A imagem pode conter: texto que diz "Para quê. .I? CORREIO CMJORNAL.PT Guerra colonial custou 21,7 mil milhões de euros a Portugal"
"..."
Descida da Serra do MAPÉ ! Picada Macomia -Mataca! 1971
Mais uma coluna...
...de pé ao lado do Condutor Menezes.
Assustava o declive!
O 404 com os travões na "miséria"! 
O Menezes, gago "até à quinta casa"...vai dizendo que não consegue segurar o Unimog! 
Vou_lhe dizendo que encoste à barreira e seja o que Deus quiser! 
Felizmente chegamos à Mataca! Uff.



Serve esta memória para recordar um episódio já depois do 25 de Abril, em que este "artista" me encontra em Lisboa.em 1975, jogava a minha ACADÉMICA com o Benfica no Estádio da Luz. 
Com um grupo de amigos, e à boleia, sem capa e batina, estando numa fila para a bilheteira, sou incomodado pela garupa de um cavalo da GNR. 

Como isto se repetiu varias vezes, viro-me para o GNR que montava o cavalo e disparo: - Oh Senhor Guarda, por favor tenha mais cuidado com o cavalo!!

Lá nas alturas...e olhando bem para mim, com um rasgado sorriso, responde : - Oh meu Furriel sou o Mene...o Mene... Menezes ..., da 2752!

Nem queria acreditar no que estava a ouvir. 
Eu de barbas bem longas, jeans e com um "visual" bem diferente dos tempos do "camuflado " sou reconhecido por um amigo, que identifiquei logo dada a sua gagez! 
Era o condutor, me me conduziu tantas e tantas vezes, naquelas temíveis picadas de Cabo Delgado.

Após ter pedido autorização ao graduado, apeou ...e trocamos um forte abraço. 
E a emoção foi grande !
E tive direito a uma "pala" militar !

Vim a saber mais tarde, que tinha ingressado na GNR, com a influência do Capitão da Companhia.
Enfim mais uma "memória" antes que os neurónios se f******!!!!
Nota - Os astericos significam "fundam"..."queimem"!!!!
Abraços
...48 anos depois ....ainda respiro! !!!!!

sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

HISTÓRIA DA MINHA IDA À GUERRA (pareço o Solnado), por Livre Pensador

HISTÓRIA DA MINHA IDA À GUERRA (pareço o Raul Solnado)

Haverá camaradas que não sabem que fui como voluntário para a tropa, assim como há outros que têm conhecimento desse facto. 

Mas decerto que uns e outros perguntarão porque razão me passou essa loucura pela cabeça. 
Pois bem, é precisamente isso que pretendo esclarecer nesta minha história. Naqueles tempos (décadas de 60 e 70) era habitual aparecerem em Lisboa cartazes afixados a solicitarem voluntários para o exército. 
Não sei se aconteceria o mesmo noutros locais do País, mas presumo que talvez. 
Esses cartazes diziam que, quem fosse voluntário aos 18 anos, tinha a possibilidade de escolher a arma (cavalaria, infantaria, engenharia, etc.) em que desejasse cumprir o serviço militar.

Acontece que eu tinha informações, por familiares meus já regressados da guerra colonial, que essa mesma guerra piorava à medida que o tempo ia passando. 
Logo pensei que quanto mais cedo fosse menos seriam os perigos a enfrentar e, portanto, há que me oferecer como voluntário. 

No requerimento que fiz em meados de 1970 (com 18 anos), pedi para ser integrado na arma de engenharia, por ser aquela que estava directamente relacionada com a minha profissão de Desenhador que já desempenhava desde os 15 anos, após a conclusão do Curso Industrial.

Em Setembro ou Outubro de 1970 recebi uma guia de marcha para me apresentar no quartel em Setúbal para ser sujeito à inspecção militar. 
Nunca percebi porque razão, havendo tantos quartéis em Lisboa, tive de ir fazê-la a Setúbal.

Quando cheguei à porta do quartel em Setúbal, já lá estavam mais 4 ou 5 "loucos" como eu. 
Ainda mais "loucos" ficámos quando nos disseram (um amarelado qualquer) que não tinham indicações para fazer inspecções militares e mandaram que fossemos às instalações do D.R.M. (Distrito de Recrutamento e Mobilização).

No D.R.M. também não sabiam de nada e "devolveram-nos" ao quartel. 
Aqui chegados, e depois de muito esperarmos, lá arranjaram um "veterinário" que nos fez a inspecção, nos aprovou e afirmou: "grande País este que até tem voluntários para a guerra"! 
Cada um de nós seguiu depois o seu destino ficando a aguardar pelo dia da incorporação.

Resultado de imagem para epc santarem

No meu caso esse dia chegou a 11 de Janeiro de 1971 com a entrada no destacamento da Escola Prática de Cavalaria em Santarém, para iniciar a recruta no C.S.M. (curso de sargentos milicianos) plenamente convencido de que, no final dessa mesma recruta, me seria atribuída uma qualquer especialidade relacionada com a arma de engenharia.

Quando nos últimos dias de Março de 1971 foram divulgadas as especialidades de cada militar e me foi indicada a de atirador de cavalaria, obviamente a minha reacção foi: "não pode ser, tem de haver engano"!

Rapidamente pedi para ir à presença do comandante de esquadrão (tenente Capão) a quem informei que tinha de haver erro na atribuição da minha especialidade, pelo facto de ser voluntário e de, nessa qualidade, ter escolhido a arma de engenharia e não cavalaria.

Com uma grande calma e um ar de gozo o tenente Capão diz-me: "o edital que leste dizia que podias escolher a arma, e tu escolheste, mas não dizia que te era dada. 
Fica sabendo que todos os voluntários terminam em atiradores"!
Nesse momento apenas me vieram à memória três palavras, F.D.P.!!!

Após regressar de Moçambique, durante muitos anos me penalizei por ter ido como voluntário, pois com o acontecimento do 25 de Abril, poderia ter ido ao ultramar (ou até não ter ido) apenas por pouco tempo e livre, pensava eu, de todos os perigos e sacrifícios que por lá passámos desde Fevereiro de 1972 até Março de 1974. 

Resultado de imagem para chai moçambique

Porém, quando hoje em dia vou tomando conhecimento, pelo Facebook, das situações vividas no pós 25 de Abril pelos camaradas de Omar, do Chai, de Nangololo e alguns outros casos, chego à conclusão de que a minha loucura não foi tão louca quanto isso!

ÀS VEZES AS COISAS NÃO CORREM MUITO BEM..., por Gilberto Pereira

Duarte Pereira
Moderador


ÀS VEZES AS COISAS NÃO CORREM MUITO BEM.
QUE O DIGA O Gilberto Pereira.
=========================

‎Duarte Pereira‎ 
para BATALHÃO DE CAVALARIA 3878
2 de fevereiro de 2014 · 
SE ESTE TEXTO DO GILBERTO PEREIRA NÃO FOR PARA O BLOG SAIO DA FOLHA. 

É DESTAS HISTÓRIAS QUE EU TAMBÉM GOSTO DE LER.
SEJAM PASSADAS NA COZINHA, NO REFEITÓRIO NAS CAMARATAS ETC.

Resultado de imagem para macomia moçambique

Gilberto Pereira comentou- VOU CONTAR UMA HISTÓRIA AO PARDAL E AO DUARTE:

Um dia à hora de arrear a bandeira, eu estava de Sargento Dia e acho que o Cabo Dia era Silva e o pelotão sapadores e o pelrec estavam fora, logo os dois, que tinham essa missão.

Resultado de imagem para macomia moçambique

Como não chegavam eu disse ao cabo para arranjar aí uma malta para irmos arrear a bandeira.
Então apareceram escriturários, impedidos, cozinheiros eu sei lá.
Fiquei a olhar para aquilo, uns de farda 2 outros de 3 uns de botas outros de alpercatas enfim, a corneta tocou e lá foi aquela cowboiada toda; esq. dir. esq. dir. e quando à voz de alto iam caindo em cima uns em cima dos outros: à voz de direita volver, uns ficaram virados para a bandeira, outros ao contrário.

Imaginem o que eu não lhes disse.
Nessa altura já tinha visto o Comandante a espreitar da janela, logo vi que ia sobrar para mim.

Acenei ao clarim para dar o toque para arrear e depois na voz de direita volver um que não me lembro quem era até ficou virado pro Subtil, até lhe disse estás com fome?

Começaram a marchar passos trocados, nisto o comandante abriu a janela e à voz de ombro arma um ficou com a arma parecia que ia aos pardais.
Nisto só ouvi a voz do comandante --- nosso furriel depois venha ao meu gabinete --- e aquela escumalha lá chegou ao portão todos contentes a pensar que tinham feito um figurão.
Destroçar---- ai o que eu lhes disse, nem o diabo gostava de ouvir!!!!

2ª parte------------
E agora falta o mais difícil, disso eu tinha consciência--- que fazer?
O que me vai acontecer?
Pensei rápido------ puxei a culatra atrás e lá fui: Entrei no gabinete do Comandante com a "perfomance" dum militar de carreira.

Ele estava atrás da secretária levantou-se e disse-me tanta barbaridade, e cada uma eu respondia: sim meu Comandante.
Estava a ficar irritado com a minha resposta que era sempre a mesma, de repente saiu detrás da secretária e veio posicionar-se à minha frente, encostou o nariz dele quase ao meu e nessa altura eu pensei em milésimos de segundo---se me tocas dou um passo atrás e adeus meu Comandante.

Mantive-me firme e ele disse-me em voz alterada---- você é uma porcaria, vou mandá-lo para a Chefina e despromovê-lo------ e eu respondi; sim meu Comandante---- e ele disse: desapareça--- e eu respondi: sim meu Comandante----- e saí porta fora.

Passados dias outra evacuação para Nampula -- estadia 6 meses----- FURRIEL SOFRE.............

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

"HOJE EM DESTAQUE" - " A GRANDE EVASÃO", por Duarte Pereira

RECORDANDO ARTIGOS ESCRITOS NO " PASSADO".
NÃO PERCAM.
=========================================
Duarte Pereira
17 de Março de 2015
"HOJE EM DESTAQUE"
" A GRANDE EVASÃO"
ACTOR PRINCIPAL




Gilberto Pereira comentou- António Encarnação, NO COMENTÁRIO ATRÁS DISSESTE QUE O VOSSO ESCRIBA ERA BEM MAIS REFINADO QUE EU. 

FIQUEI A PENSAR E SINCERAMENTE NÃO ENTENDI. 

O MEU PALMARÉS RONDA EXACTAMENTE 1/3 DO TEMPO DE SERVIÇO DESENFIADO NO EXTERIOR. NO RESTANTE NEM SE FALA, QUASE SEMELHANTE A UM TURISTA, NUNCA FIZ PORRA DUM CORNO, ATÉ O 1º SARG CARTEIRO DIZIA: MAL EMPREGADO DINHEIRO NUM SACANA DESTES. 

AGORA SE ERA REFINADO OU EM BRUTO, ISSO EU NÃO SEI. FIZ TANTA MERDA QUE JÁ NEM ME LEMBRO, SÓ QUANDO ME AVIVAM A MEMÓRIA. BEM HAJAM OS QUE DERAM O LITRO POR MIM, UM ABRAÇO PARA ELES.

Gilberto Pereira E POR FALAR ÁS VEZES ME LEMBRO DE ALGUMAS, VOU CONTAR-TE ESTA António Encarnação : NUM DOMINGO BEBEMOS UNS COPOS E COMO O MÉDICO TINHA IDO PARA UMA QUALQUER COMPANHIA, EU PERGUNTEI AO BATANETE SE ERA VERDADE, ELE DISSE QUE SIM QUE TINHA IDO LÁ PARA O CHAI OU COISA QUE O VALHA E ENTÃO COMBINEI COM ELE PARA SIMULAR DOENTE PARA SER EVACUADO. 

ENTÃO FIQUEI NA CAMA AOS AIS E ELE TEVE DE DAR CONHECIMENTO AO MÉDICO VIA RÁDIO QUE EU ESTAVA COM FEBRE E ,MUITO MAL E O MÉDICO DEU AVAL Á EVACUAÇÃO O HORAS. 

O COMANDANTE SIMÕES FOI AO MEU QUARTO MAS ANTES TINHAM AVISADO QUE ELE VINHA LÁ, AINDA FIZ PIOR QUANDO ELE ENTROU E VIU AQUELE ESPECTÁCULO NÃO TEVE DÚVIDA QUE TINHA DE SER EVACUADO. 

TRATARAM DE TUDO E Á NOITE LÁ IA EU NA MACA RUMO Á PISTA. 

TEVE DE SER ILUMINADA E FUI ESTREAR UM TÁXI AÉREO OU LÁ O QUE ERA. 

QUANDO IA ATRAVESSAR A PARADA NA MACA, NÃO SEI BEM SE FOI O BARROS METEU-ME UMA CERVEJA E UMA SANDES DEBAIXO DAS COSTAS E O BATANETE TREMIA E DIZIA-ME BAIXINHO: NÃO TE DESMANCHES SENÃO VAI TUDO PRESO; E LÁ FUI ATÉ MUEDA ........ 

O RESTO CONTO-TE QUANDO TIVER PACIÊNCIA .......

-------- ONDE ESTÁ O MILITAR QUE FARIA UMA CENA DESTAS? 

QUERO CONHECÊ-LO PESSOALMENTE PARA LHE DAR UM ABRAÇO.



António Encarnação Ok, de acordo. Apenas acrescento que entre Macomia e Mueda ...
Quase de certeza que todo o pessoal de Mueda gostaria de passar umas temporadas na paz de Macomia.

Gilberto Pereira MUEDA ERA TRAMPOLIN PARA NAMPULA

António Encarnação comentou- Pelo contrário, eu não fui um desenfiado. 
Por razões de serviço, tinha idas frequentes a Porto Amélia e fiz um "raid" da Beira a Macomia, que foi muito especial e cuja recordação, guardo com satisfação.

Mas como disse, não tinha o espírito de me desenfiar e, por isso e ainda bem, nunca entrei num hospital.
Bem, a verdade é que, embora tivesse pensamentos muito contrários a muita coisa que se passava e decidia, assumi que o meu lugar era ali e fiz os possíveis por participar, de forma construtiva, na vida dos que faziam parte daquela minha nova família. 
Por vezes, até tinha a ousadia de pensar que fazia falta.

Não me desenfiei, mas confraternizei e fiz amizades que, ainda agora, se revelam fortes em pequenos pormenores.

Tenho ideia, talvez errada, que o tempo que passou, o muito tempo que passou, nos leva, eventualmente, a sobrevalorizar e a desvalorizar algumas recordações, de forma a ficarem mais próximas daquilo que agora pensamos ou de como gostamos de olhar para nós.

Como já tive oportunidade de escrever antes, desliguei completamente de Macomia e não vejo quaisquer razões para modificar, mesmo que só para mim, o que pensei e o que fiz. 

Tive uma passagem discreta por aquela terra, mas vivi-a com muita intensidade, como atestam as muitas centenas de slides e fotos que fiz, não da guerra, mas da terra e do seu povo.

Hoje, estou apaziguado com tudo o que aconteceu e recordo com saudade e grande amizade, muitos amigos, mesmos alguns que nunca mais encontrei.

Estas e outras razões, levam-me a aceitar calmamente, cada um dos restantes elementos desta página, a tentar perceber o seu posicionamento em relação aos diversos assuntos, sem espaço para zangas ou birras de espécie alguma.

Estamos juntos.