domingo, 23 de fevereiro de 2014

VIDA de um não MILITAR, por Armando Guterres



 
VIDA de um não MILITAR

Quinta 02/07/1970 - Banho na ribeira - primeiro ato militar com os catorze mancebos da aldeia.

Sexta 03/07/1970 - Inspecção sanitária, no velho edifício dos Bombeiros Voluntários do Fundão. Resultado previsível "todo o serviço" - não conseguido, segundo os interesses deles.
Santarém - terça feira 12/01/1971 - como recrutado.
Não recortaram grande cousa....
 
Sábado 03/04/1971 - Recruta pronto.
 
Domingo 11/07/1971 - 1.º cabo miliciano - Apresentação no RC4.
Missão pastar a vaca, com um intervalo de 3 semanas em Tancos no Curso de Buracos e Alçapões. Continuação de pastar a vaca - um trabalho que levei a sério e cumprimento segundo o RDM.
Sargento de dia num Domingo - Arrear da Bandeira: um puxão para baixo + dois para cima e depois de três tocaduras ...
Não faço ideia de quem a pôs cá em baixo.
 
Segunda feira 20/09/1971 - no gabinete de um capitão.
Tínhamos chegado atrasados dez "pastores".
Conforme iam dando justificações, iam levando dez dias.
Chegou a minha vez e dei a razão de ter perdido o comboio, que de propósito não tentei encontrar (festa civil na aldeia).
Mostrei o pulso e disse "MEU CAPITÃO O PONTEIRO DOS MINUTOS CAIU E POR ISSO CHEGUEI ATRASADO AO APEADEIRO".
Fiquei muito admirado da sua cara simpática a mandar-me retirar.
Os restantes continuaram a colecionar dez dias.
Terça feira 08/02/1972 - Teatro Vitória uma secção da Revista e corrida para Santa Apolónia. Abrantes - Santa Margarida de táxi.

Quarta feira 09/02/1972 - Furriel Miliciano Graduado - embarque no Figo Maduro - Luanda.
 
Quinta feira 10/02/1972 - Chegada à Beira de manhã.
Saída do quartel para cidade num autocarro de 2 pisos que tencionava ir vazio (abanou o suficiente até abrir as portas).
Andei sozinho à procura de uns primos que não encontrei.
Disse a um VCC que tinha uma nota de mil e ele foi comigo a uma cervejaria e fez questão de pagar as Laurentinas.
Jantar numa cervejaria com muita da nossa malta.
Um Alfero comando, chegado de Tete, pede ao n/capitão-proveta autorização para uivar.
Endireitou as facas de peixe que o empregado lhe ia dando.
Sexta feira 11/ 02/1972- Entrega das G3.
Voo fretado à DETA.
Último voo em que serviram bebidas alcoólicas nesses fretes.
Bebeu-se toda e qualquer que ia embarcada. Coitadas das hospedeiras!!!!
Porto Amélia debandada de armas e bagagens para pensões e hotéis.
Fui um dos que dormiram no quartel (num canto num monte de colchões).
 
Sábado 13/02/1972 - Queixa às autoridades militares, porque o pessoal invadiu a praia da messe dos oficiais e de fato de banho, uns de cuecas e outros nem isso.
Ao anoitecer recebemos as munições.
Trepámos para as viaturas atribuídas, transporte de gado com os respectivos taipais.
Paragem em Ancuabe para formar a coluna com a devida protecção.
Domingo 13/02/1972 - Recepção pelos velhinhos.
Saída para a Mataca.
Muito bom acolhimento no resort.
Terça feira 15/02/1972 - Os velhinhos leváramos para Macomia.
Quinta feira 17/02/1972 - Regresso à Mataca ...

 

sábado, 22 de fevereiro de 2014

E assim começa o livro, por Paulo Lopes


 
 
Rui Briote! Nem eu e já escrevo (para mim, principalmente) há muito tempo e, neste meu livro que uma plateia restrita leu e que agora, a conta gotas, os meus companheiros de "guerra" vão tendo a paciência de ler, começo por dizer:
Como é evidente, tod
os os nomes constantes neste romance (se for esse o titulo que se lhe possa ser atribuído) são inventados, assim como também tudo o resto, e o resto nem sempre é tudo o que sobra, porque sobra ainda a veracidade das cidades, vilas, lugarejos e pontos esquecidos nos mapas convencionais.

Tudo o que poderá parecer ,não o é, e será isso sim, uma pura e simples coincidência.

Coincidências aplicadas a nomes de tantos jovens feitos homens prematuros que já não podem; não querem; ou não conseguem, ler estas palavras que descrevo.
 
Digo eu que tenho, quando em vez, de dizer coisas.

Não sou escritor, porque a capacidade para tal está tão longe como África.

Apenas e ao longo de anos, juntei folhas rascunhadas, rasguei e voltei a rascunhar, dando origem a este amontoar de frases que, unidas, têm a intenção (pensamento secreto e reservado) de ser uma simples crónica transformada em livro!

 
Apenas e somente isso:
intenção (pouca).

E assim começa o livro.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Aí vai mais um relato: A ida para Moçambique... Ida para o Desconhecido, por Rui Briote



Quarta feira de cinzas, 16 de fevereiro de 1972, ao fim de uma tarde cinzenta, saímos de Santa Margarida, postos em autocarros rumo ao aeroporto de Figo Maduro, afim de partir para a nossa colónia de férias " resort Moçambique"...
 
Boing 707 da FAP
 
Um pássaro gigante, mais conhecido por avião, tripulado por pilotos da FA. ganha balanço e lá vamos nós a subir aos céus e ver Lisboa a fugir-nos rapidamente da vista...lágrimas afloram e correm de mansinho pela face...
As hospedeiras, aliás hospedeiros, também não ajudavam muito.
Já no ar, deixámos o nosso querido Portugal para trás, na altura conhecido por Metrópole.
As nuvens que sobrevoámos pareciam algodão ...
Que delícia para os nossos olhos!
     
Boing 707 da FAP, em Terra e em Voo

Seis horas depois, passámos o Equador e entramos no hemisfério sul em direção a Luanda, onde iríamos aterrar para relaxar.
Uma centena e meia de homens foi colocada num espaço exíguo e, com o calor que fazia, começamos a destilar e aí permanecemos uma hora mais minuto menos minuto.
 
Embarcámos de novo, rumo à cidade da Beira.
 
A aproximação à pista foi um tremendo susto, pois o avião começou a dançar, ora para a esquerda ou para a direita, e ao vermos o rio Zambeze (segundo o Hélder Losna (ECAV1), seria o rio Pungué e não o Zambeze, já que este último fica ainda longe da cidade da Beira), serpenteando com um caudal enorme, mesmo debaixo do nosso nariz ... os nossos corações começaram a bater forte, fortemente...será que iremos tomar um banho forçado?
Agarrados aos bancos estávamos a preparar-nos para tudo...
Finalmente, os pilotos lá endireitaram o avião e fizemos uma aterragem nada suave, mas chegamos inteiros...
UFA que alívio!!!
 
Aeroporto de Beira (Moçambique)
 

Já em terras africanas debaixo dum calor abrasador, entreolhávamo-nos com ar inquisidor, pois os olhares recaiam sobre nós e, de vez em quando lá se ouvia ..."aqui estão mais checas...".
Só esta receção já nos atemorizava, mas lá caminhámos para o quartel para tratar de receber a fiel companheira G3 e novas ordens.
 
Já ao fim da tarde fomos para os nossos aposentos para descansarmos.
Aproveitei essa folga para juntamente com o ex-alferes Ribeiro ir jantar a casa da prima da minha então namorada, hoje minha mulher, que morava junto à igreja de Nossa Senhora de Fátima.
 
Após o mesmo, quando regressávamos para os quartos, mais ou menos a meio caminho, virei-me para o Ribeiro e propus-lhe uma volta pela cidade.
Interrogámo-nos:
"Para onde?"...
Fizemos marcha atrás e eis que deparámos com a Boite Diana, que ficava junto ao Moulin Rouge.
Decidimo-nos pela primeira, para ver uma sessão de striptease ...
 
Moulin Rouge - Beira (Moçambique)
 
Entrámos lentamente com uma curiosidade latente nos nossos olhos bem abertos.
A sala iluminada por luzes psicadélicas anteviam um bom espetáculo para os checas.
Sentámo-nos logo nas mesas junto ao palco, pois queríamos estar em cima do acontecimento...
 
De súbito, ao som duma música quente, surge uma beldade toda ondulante e provocante.
Ao mesmo tempo que nos recostávamos nas cadeiras, os nossos olhos escancaram-se para não perder pitada do espetáculo.
A bailarina loira ou morena para aqui não interessa, num mexe, remexe com movimentos lentos e doces, lá se vai " descascando "...Eis senão quando, entra em cena uma cobra.
A beleza, pega nela sem receio e coloca-a ao pescoço, qual cachecol...
Ai que arrepio!!!...
A cobra, languidamente percorre o corpo desnudo, passando por áreas proibitivas, apertando a "nossa amiga" cada vez mais...
Só se ouvia a música suave que acompanhava o bailado, pois os espetadores estavam embevecidos com tanto bamboleio...
 
Infelizmente o fim do show chegou, mas iríamos ser surpreendidos.
Estávamos na "sobremesa" do espetáculo e, eis que a bailarina se aproxima de nós.
Gentilmente levantámo-nos, sim os dois ao mesmo tempo e puxámos por uma cadeira.
Ela com um sorriso rasgado sentou-se na nossa companhia. Lá tivemos que pedir um " chá" para a menina e encetámos uma conversa, não muito longa, mas com boas perspetivas... Num bate papo curto, mas " incisivo" convidámo-la a fazer-nos uma visita lá em cima, mais propriamente no Chai...e a malandra com sorriso cativante prometeu-nos tal desígnio...
 
Chegada a hora da despedida ela foi feita com um beijinho...soube a pouco, claro, mas ficou a promessa...até hoje!!!

Já a madrugada ia avançada, regressámos ao quartel e só uma forte chuvada nos acalmou após tão excitante noite em vésperas duma nova viagem, desta vez rumo a Porto Amélia...

 
Aeroporto de Pemba - Moçambique
  •  
    Rui Briote Este relato refere-se à ida para Moçambique...
     
  •  
    Fernando Bento Engraçado a nossa viagem (C.C.S.) foi identica à vossa, só que eu fui para a boite Primavera, o relato está porreiro. Ao fim de 40 anos estas memórias continuam bem vivas, parece que foi ontem, não é?
  • Um abraço Briote.
     
  •  
    Rui Briote Abraço Amigo...
     
  • Rui Briote porque é que ao fim de 40 anos esquecemos o nome da maioria daqueles que conviveram junto de nós tantos meses e não esquecemos estas história das quais conseguimos fazer um relato tão completo?
  • Um Abraço
     
  •  
    Rui Briote Tem que se puxar um pouco pela memória e recorrendo a cábulas....
  • Abraço
     
  •  
    Paulo Lopes Afinal ainda há muita história por contar que, timidamente, vai-se soltando das gavetas!
    Tudo cá para fora amigo Rui Briote! Se não para mais, que seja para me convencer que eu não percebo nada de escrita!
     
  •  
    Rui Briote Amigo não tenho pretensões a ser " escritor"...limito-me a fazer um relato e tenho outro na forja e será já a caminho do Chai...com calma e puxando pelos miolos...abraço
     
  • Rui Briote uma dúvida? A saída não terá sido a 16 de Fevereiro?
  • Confirma na caderneta militar...
     
  • Rui Briote não contas que na 3ª feira de carnaval fomos a um baile numa das localidades próximas de Santa Margarida, onde fizemos furor a dançar sozinhos, sem par e com a sala cheia... eramos para aí uns 20 ou 30?
     
  •  
    Rui Briote Lembro-me disso...o baile foi em Abrantes...nós saímos na quarta feira de cinzas
     
  • Rui Briote! Nem eu e já escrevo (para mim, principalmente) há muito tempo e, neste meu livro que uma plateia restrita leu e que agora, a conta gotas, os meus companheiros de "guerra" vão tendo a paciência de ler, começo por dizer:
    Como é evidente, tod
    os os nomes constantes neste romance (se for esse o titulo que se lhe possa ser atribuído) são inventados assim como também tudo o resto, e o resto nem sempre é tudo o que sobra, porque sobra ainda a veracidade das cidades, vilas, lugarejos e pontos esquecidos nos mapas convencionais.
    Tudo o que poderá parecer não o é e será, isso sim, uma pura e simples coincidência. Coincidências aplicadas a nomes de tantos jovens feitos homens prematuros que já não podem; não querem; ou não conseguem, ler estas palavras que descrevo.
  • Digo eu que tenho, quando em vez, dizer coisas.

    Não sou escritor porque a capacidade para tal está tão longe como África.
    Apenas e ao longo de anos, juntei folhas rascunhadas, rasguei e voltei a rascunhar dando origem a este amontoar de frases que, unidas, têm a intenção (pensamento secreto e reservado) ser uma simples crónica transformada em livro!
  • Apenas e somente isso:
    intenção (pouca).

    E assim começa o livro.
     
  •  
    Rui Briote Uma justa e merecida homenagem a quem lá ficou...apareçam mais testemunhos...
     

  •  
    Jose Capitao Pardal O que sucedeu com a aterragem, diga-se de passagem com excelente visibilidade, foi que o "checa" do piloto, que tinha ido tirar um curso intensivo de 707, à Boeing (certamente só de simulador), primeiro, por confusão certamente, fez-se à aterragem ao Rio Zambeze (que levava um elevado caudal, ou não fosse tempo das chuvas), e não ao aeroporto da Beira e depois viu-se "grego" para levantar novamente o aparelho, para se fazer à pista...

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

E assim foi... um almoço, por Paulo Lopes


E assim foi!

Assim se passou um pouco do sábado que, sendo igual a tantos outros sábados, no tempo hora, no dia, nos segundos, tornou-se totalmente diferente porque trouxe com ele, os eles (e suas, algumas, esposas) acabando por, obrigatoriamente, desfazer o igual dos outros sábados, dos outros dias.


Agarrado a eles traziam a saudade que se espelhava nos olhos, nos abraços quase beijos, sem falsidade nem sensações fingidas!
O natural e puro!
 

E dentro dessa saudade amassada no p...eito e fervida na alma, fermentada por tantos anos, vinha o convívio desejado, a espontaneidade dos discursos individuais e coletivos das vozes, que se misturavam no ar, esbarrando com as palavras que esvoaçavam numa única mesa, de lugar para lugar, de sentido para sentido, sem oposição nem governo, enxurrada de episódios já conhecidos por uns, não tanto por outros, talvez até já muitas vezes repetidos que, pela sua repetição se tornam sempre originais, mas que são e sempre serão um fator comum da família, que nos uniu já lá vão mais de quarenta anos.
 

Também essas mesmas palavras bailaram entre si e passeavam numa velocidade ultra sónica do ontem, para os dias de hoje, onde se cruzavam os meninos que éramos, aos avós que alguns são, no meio de uma garfada, do que nos empurrava as conversas misturadas com um copo de vinho ou de nada, os quais serviram para brindar os ausentes, que os presentes presentearam com um sorriso no semblante!
 
E entre um principio de fado e umas dedilhadas de viola que não existia, fomos comendo o que já não me lembro, porque foi apagado pela força da recordação de estar com meninos e moços, a quem roubaram parte da juventude mas, no outro lado da moeda, não conseguiu tirar-nos a amizade que, mesmo afastada e corroída pela ferrugem da vida e do espaço, nos vai mantendo juntos.

E assim foi.