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sábado, 8 de dezembro de 2018

LER FAZ BEM... O PORTO EM 1883, Excerto de As Farpas de Ramalho Ortigão, reescrito por Duarte Pereira

LER FAZ BEM.
Uma oferta do nosso compadre Rui Briote, que será passado para aqui, às "mijinhas".
Malta do "Puerto" , recuem um pouco.
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O PORTO EM 1883

Excerto de "As Farpas" de Ramalho Ortigão

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1ª PARTE

«O panorama, extraordinariamente belo, que se descobre da grande ponte sobre o Douro começa a desenrolar aos nossos olhos os seus diferentes aspectos tão variados, tão imprevistos. 
O rio, liso, e espelhado como uma chapa de vidro azul e verde. 
Uma extensa cordilheira de colinas, cobertas de pinheirais e desenhando no espaço vaporoso e húmido as curvas mais suaves e as perspectivas mais graciosas e mais risonhas.
À beira da água, sulcada de barcos, de cor escura, esguios, da forma de gôndolas venezianas, remados de pé com largas pás que bracejam silenciosas e lentas, arredondam-se em grandes massas de um verde-escuro e espesso os velhos arvoredos das quintas do Freixo, da Oliveira, de Quebrantões e de Avintes.

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Apeamo-nos finalmente na estação de Campanhã. 
Uma fila de carruagens sobre a linha dos eléctricos. 
Um rumor diligente e alegre de tamancos novos sobre os largos passeios lajeados. 
Mulheres bem feitas, caminhando direitas, de cabeça alta, cintura fina solidamente torneada sobre os rins, e alegres lenços amarelos, de ramagens vermelhas, encruzados sobre a curva robusta do peito. 
Canastras bem tecidas, grandes como berços, cobertas de pano de algodão em listras azuis e encarnadas. 
As carruagens americanas recebem tudo, gente, cestos de fruta, canastras, trouxas de roupa branca, caixotes, seirões com ferramentas. 
Dos vinte passageiros de Campanhã que tomam lugar connosco no carro americano dois têm escrófulas, e um tem uma grossa corrente de ouro no relógio e um grande brilhante pregado no peito da camisa.

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2ª PARTE.
Os melhoramentos materiais na cidade que acabo de entrever são na verdade, consideráveis. 
As novas ruas, a prolongação da Boavista, a de Mouzinho da Silveira, paralela à rua das Flores, a de Passos Manuel, desde Santa Catarina à Rua de Sá da Bandeira, a rua que liga a estação do Pinheiro com a cidade, e outras, acham-se quase inteiramente guarnecidas de prédios e todos os prédios habitados. 
Outro tanto sucede nos bairros novos do Palácio de Cristal e da Duquesa de Bragança. 
O Bairro Herculano, entre o Jardim de S. Lázaro e as Fontainhas, é um recinto murado, fechado por uma grade de ferro, compreendendo duzentas ou trezentas casas, de rés-do-chão, ou de um andar, comodamente alinhadas, com um pequeno jardim comum, um mercado, lavadouros, enxugadoras, etc. 
Está já delineado, com as ruas em esboço, o projetado bairro do Campo do Cirne, em frente do Cemitério do Repouso, ao lado da Rua do Heroísmo. 
E a nova ponte, que vem da serra do Pilar às proximidades do Paço do Bispo, demolirá e transformará em novas avenidas os bairros antigos do Barredo e da Sé.

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Aqueles que há vinte anos partiram daqui, como eu, arriscam-se, regressando depois de mim, a não atinar com o seu caminho, a não encontrar a sua casa, nem a sua rua, nem os seus sítios. 
Deixou de existir a antiga Rua do Souto, a das Congostas, a dos Mercadores, a da Bainharia e a tão pitoresca e tortuosa Rua da Reboleira, com o seu arco da Porta Nobre, as suas janelas em ressalto como as das velhas casas flamengas, e as suas tanoarias, por entre cuja frescura era tão bom no Verão passar à sombra, no picante cheiro da aduela e dos vimes do vasilhame, ao vir da Foz em char-à-bancs sob o sol a pino!
Dir-se-ia que os nossos pais morreram para nós muito mais completamente do que morreram para eles os seus avós e os seus bisavós, levando consigo, ao desaparecerem, quase tudo quanto os rodeava na vida: a casa, o jardim, a rua que habitavam".

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Mais poemas, por Paulo Lopes

Paulo Lopes 
Amigo Rui Briote
Foi, é e será isto o mundo que me faz pensar
  • POR TI ME FAZ PENSAR

    Desobediente floresce
    na claridade negra
    de uma análise interna.

    A realidade

    E a culpa recaída
    sobre a cabeça de ninguém
    revolta as veias paradas
    no seio da distância
    que por ti me faz pensar.
  • Eis-me aqui a assistir
    à interior evolução
    do poema

    Desde não sei quando aqui cheguei
    a minha luta se trava
    em batalhas de semântica

    Para aqui vim por cá fiquei
    habito a terra
    e fui semente

    Colono a desvendar esta floresta
    de dúvidas - vou habitando
    o sonho que me mente

    domingo, 20 de julho de 2014

    Carta de uma mãe ao Ministro do Exército, por Virgínio Briote e Luis Graça

    Foi com alguma emoção que li este texto da autoria do Virgínio Briote, irmão do meu grande amigo e companheiro de algumas desventuras, por terras de Moçambique, mais propriamente, em Chai - Cabo Delgado...
    É pois da dor da mãe do grande amigo Rui Briote (o último da esquerda na foto de família), gravemente ferido no aquartelamento daquela localidade, com uma granada de morteiro, que estamos a "falar".
    Tal como todas as mães, quis o melhor para os seus filhos... que a pátria (ou quem decidia em nome dela) mandava para uma guerra, sem sentido, há muito perdida e adversa dos ventos da história, que seguiam em sentido contrário...

    JCP

    .................///....................

    Guiné 63/74

    - P13405: Tantas vidas (Gil da Silva Duarte / Virgínio Briote) (2): As nossas mulheres: carta de uma mãe a Sua Excelência o Ministro do Exército, datada de 4 de fevereiro de 1963, intercedendo por um filho que acabava de ser mobilizado para o CTIG, depois de um outro ter sido morto em Angola, em 23 de abril de 1963...


    Portugal > Finais dos anos 50 >  "Fotografia de mães e filhos, em finais dos anos 50, com a guerra já no horizonte".
    "Todos esses rapazes foram para África: um para a Guiné, e dois para Moçambique, regressando um destes paraplégico".

    Foto (e legenda): © Virgínio Briote  (2014). Todos os direitos reservados [Edição: L.G.] 1. Mensagem do nosso editor (jubilado) Virgínio Briote, e referência incontornável do nosso blogue, para o qual entrou na data já distante de 23/10/2005 (*):
     
    Data: 16 de Julho de 2014 às 14:43
     
    Assunto: As nossas Mulheres 
     
    Caros Luís e Carlos, Dei agora com uma carta que, naqueles tempos, me foi entregue em Brá. É evidente que os nomes estão omitidos, mas a carta é verdadeira. Devolvi-a ao filho da Senhora que a escreveu há pouco mais de meia dúzia de anos, estava a Mãe ainda viva!

    Um abraço do VB [, Virgínio Briote, ex-alf il cmd, cmtd Gr Diabólicos, CCmds, CTIG, Brá, 1965/67: , foto à esquerda, c. 1965]

    2. Carta ao Ministro do Exército
     
    Exmo. Senhor
    Ministro de Exército
    Excelência,
    Venho respeitosamente dirigir-me a Vossa Excelência expondo-lhe o seguinte.
    Sou mãe do 2º Sargento Miliciano ..., morto em Angola, no Quitexe, em 23 de Abril de 1963.
    Após 22 meses (?) ao serviço da Pátria, o meu filho, que era a luz dos meus olhos lá se ficou.
     
    Hoje tive conhecimento que outro meu filho, o 1º Cabo Miliciano ..., acaba de ser mobilizado para a
    Guiné, para onde parte no dia 9 deste mês.
    Sou pobre, se não ia pessoalmente, de joelhos, pedir a Vossa Excelência que tenha pena de mim.
    Com a morte do meu ... nunca mais fui a mesma.
    Se há pessoas desamparadas da sorte, uma delas sou eu, perdi completamente o gosto por viver.
     
    Não choro os meus filhos à Pátria, choro sim a sua morte quando vejo companheiros deles, depois de apurados, descerem aos hospitais militares e ficarem livres.
    Não ensino procedimentos destes aos meus filhos, custar-me-ia muito vê-los tomar atitudes idênticas. Mas apelo ao coração, que presumo ser bom, de Vossa Excelência, que certamente também é Pai.
    A metrópole é também a nossa Pátria e o meu filho ficaria aqui a cumprir o tempo necessário e não mo mandaria para longe entrar em combates.
    Há seis anos, o meu marido teve uma trombose.
    Vive, mas é um doente, e com tudo isto vejo agravar o seu sofrimento.
    Não me convenço que meu filho…vá para tão longe.
    E pelos seus filhos, peço-lhe que mo deixe ficar.
    Vossa Excelência terá a certeza que eu terei mais meia dúzia de anos de vida, nunca mais de alegria, mas para melhor poder amparar o meu marido e meus filhos, para os quais sempre tenho vivido.
     
    Julgo bater à porta de Deus e a Ele fico a pedir para que Vossa Excelência e Família tenham uma vida cheia de saúde e felicidade.
    Respeitosamente de Vossa Excelência Maria……
     
    4 de Fevereiro de 1965.

    3. Comentário de L.G.: No passado dia 10, mandei ao VB a seguinte mensagem:  (...) Em boa forma?
     
    É só para te recordar o desafio que te lancei há tempos, e reiterei em Monte Real, no IX Encontro Nacional da Tabanca Grande...
    Não nos sacas aí, do teu baú, uns tantos textos (meia dúzia...) para dar continuidade a esta série, "Tantas Vidas"? !... 
    Estamos com 200 mil visualizações por mês...
    Vem o verão, e é preciso alimentar o blogue... sobretudo em agosto...
    Há muitos camaradas, "periquitos", que nunca tiveram oportunidade de ler o teu blogue Tantas Vidas (**), há muito desativado...
    Pensa também nesta malta,que está a chegar ao nosso blogue...
    Quando cá chegaste éramos meia dúzia de "tertulianos", hoje somos 662" (...).
    A resposta não tardou, comunicando-me que o assunto não estava esquecido, e mandando-me duas colaborações, a começar por este texto que acima publicamos, o que vem reforçar a minha esperanção, e mais do que isso, convição de que os nossos leitores vão poder ter o privilégio de ler ou reler alguns dos melhores textos da série "Tantas Vidas" do Gil Duarte & Companhia... (Gil Duarte é uma espécie de "alter ego" do VB)...
     
    (...) Os textos do Tantas Vidas?
    Nunca mais peguei neles, tenho-os arquivado no portátil, julgo que fiz a cópia total do blogue mas nem tenho a certeza de que o tenha copiado todo.
    No PC fiquei com alguns textos que copiei e antes de os publicarmos tenho que os voltar a ler, corrigir, ordenar e completar, uma vez que fechei o blogue em princípios de 2005!
    Mas podemos voltar a pegar no assunto. (...).

    Por estes dias, o VB e a Irene estarão  de visita à "família americana" (filha, genro e netos), em Seatle...
    Desejo-lhes calorosos  encontros e que bons ventos os tragam de novo à doce casa e à querida pátria, como diria o grande Ulisses, o homérico  guerreiro que levou 10 anos da sua vida a regressar à sua amada Ítaca, depois da guerra de Troia.

    ______________

    Notas do editor:
    (*) Vd. psoite da I Série, 23 de outubro de  2005 > Guiné 63/74 - CCLV: Virgínio Briote, ex-comando da 1ª geração (1965/66) 
    (**) Vd. poste de 26 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13194: Tantas vidas (Gil da Silva Duarte / Virgínio Briote) (1): Tantos anos depois... Recordar, porquê? Postado por Luís Graça at 18:49   Enviar a mensagem por e-mailDê a sua opinião!Partilhar no TwitterPartilhar no FacebookPartilhar no Pinterest Marcadores: as nossas mulheres, as nossas mães, Estado Novo, família, guerra colonial, Tantas Vidas, Virgínio Briote
     
    4 comentários:
    Luís Graça disse...
    Digam lá se o do meio não é o VB? 
    Sim, tenho uma vaga ideia de o VB um dia me ter dito que tinha um mano que foi gravemente ferido em Moçambique, na guerra colonial... 
    Espero não estar a trocar as "cassetes"...
    São as marcas, físicas e outras, que ficam am grande parte das famílias da nossa geração... 
    Obrigado, VB, por partilhares esta foto de família...
    Boa viagem até Seatle, para ti, o Gil Duarte e a Irene...
    Que te tenhas muitas alegrias ao reencontrar a tua/vossa família americana...
     
    LG quarta-feira, Julho 16, 2014 7:09:00 da tarde

    Anónimo disse...
    Não fosse a pressa, a história para ficar completa devia tê-la contado assim: a carta foi certamente enviada para o ME que a deve ter remetido para o QG/CTIG. Aqui deve ter estado parada uns tempos até ter sido enviada para Brá, uma vez que era lá que se encontrava o filho (elemento do meu grupo) da Senhora que escreveu a carta.
    O então Cmdt da CCmds do CTIG entregou-ma em mão com a indicação "desenrasque-se" e que agisse em conformidade com o estado anímico e físico do referido militar.
    Muitos anos depois, 2002/03, quando estava em casa dos meus Pais a ver e limpar os papeis e fotos que tinha trazido de lá, dei com essa carta.
    Depois entrei em contacto com o meu antigo Camarada e combinei encontrar-me com ele e passei-lhe para as mãos a carta que a Mãe tinha escrito em 1965.
    Foi com as lágrimas nos olhos que reconheceu a letra da Mãe e me disse que ainda era viva.
    Era assim que eu devia ter relatado este facto.
    O meu irmão Rui é o pequeno da ponta esquerda da foto, de boné.
    Foi atingido por estilhaços de uma granada de morteiro que rebentou no parapeito do telhado sobre o qual se encontrava, no Chai, Macomia, em Junho de 1973, salvo erro.
    Abraço VB quarta-feira, Julho 16, 2014 7:37:00 da tarde
     
    JD disse...
    Caro Virginio, Belíssima carta de desespero e de esperança.
    Houve mães de portugueses que passaram semelhantes sofrimentos.
    No meu pelotão tive um camarada com um irmão embarcado na mesma data com destino para Cabuca, era gémeo, e outro, mais velho, que já contava alguns meses em Angola.
    Quantas angústias as daquela senhora? e as de todas as mães com filhos mobilizados para o desconhecido?
    Como perguntava o poeta ao mar, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal?
    Desejo-te boas viagens nesse novo mundo, e fica atento, podes encontrar o Zé Câmara ou o Tony. Um abraço JD quarta-feira, Julho 16, 2014 9:59:00 da tarde
     

    sábado, 22 de fevereiro de 2014

    E assim começa o livro, por Paulo Lopes


     
     
    Rui Briote! Nem eu e já escrevo (para mim, principalmente) há muito tempo e, neste meu livro que uma plateia restrita leu e que agora, a conta gotas, os meus companheiros de "guerra" vão tendo a paciência de ler, começo por dizer:
    Como é evidente, tod
    os os nomes constantes neste romance (se for esse o titulo que se lhe possa ser atribuído) são inventados, assim como também tudo o resto, e o resto nem sempre é tudo o que sobra, porque sobra ainda a veracidade das cidades, vilas, lugarejos e pontos esquecidos nos mapas convencionais.

    Tudo o que poderá parecer ,não o é, e será isso sim, uma pura e simples coincidência.

    Coincidências aplicadas a nomes de tantos jovens feitos homens prematuros que já não podem; não querem; ou não conseguem, ler estas palavras que descrevo.
     
    Digo eu que tenho, quando em vez, de dizer coisas.

    Não sou escritor, porque a capacidade para tal está tão longe como África.

    Apenas e ao longo de anos, juntei folhas rascunhadas, rasguei e voltei a rascunhar, dando origem a este amontoar de frases que, unidas, têm a intenção (pensamento secreto e reservado) de ser uma simples crónica transformada em livro!

     
    Apenas e somente isso:
    intenção (pouca).

    E assim começa o livro.

    sexta-feira, 11 de outubro de 2013

    Esta é para os operacionais..., por Rui Brandão


     
     
     
    30 de Julho de 2013 23:09
     
    Caros Combatentes.
    Regressei de uma semana de férias.
    Mas ainda há mais... Calma.
    Como devem calcular estive com grande sofreguidão a ver as "entradas" do pessoal aqui na nossa página, sempre fantásticas e surpreendentes.
    Boa!!!
    No entanto, parece (poderei estar enganado) haver por aqui algum ESTATUTO assumido não sei como, por aqueles que eram tidos como operacionais em desfavor daqueles que lhes foram incutidas outras especialidades, como se estivessem menos sujeitos a perigos.
     
    Pois bem.
    Vou partilhar convosco uma história verdadeira que se passou comigo, quando eu ainda tinha alguma esperança de não ser convocado para os treinos na dita Guerra do Ultramar.
     
    É verdade, passou-se mesmo na Recruta em Santarém (quem lá passou, sabe como aquilo era...).
     
    Durante a chamada "semana de campo", eu fazia parte de uma patrulha que andava atrás dos "turras".
    Como não era possível apanhá-los (andavam sempre de pincha de um lado para o outro), o aspirante que era um tretas e ainda um valente f.d.p... mandou-nos assaltar o nosso próprio acampamento.
    Nada estava combinado ou planeado.
    Resultado, uma confusão do caraças, tiros para todos os lados e eu naquela balbúrdia toda, sou atingido com uma bala com o cano da Mauser a menos de 10cm da perna esquerda quase junto ao osso ilíaco.
    Ato contínuo levantei as patas pelo ar e fiquei estendido completamente sem forças.
    Enfermeiros, 4 agulhas espetadas na perna (nem as sentia) e toca de injetar Buscopan.
    Fui evacuado de ambulância para o Hospital da Estrela onde cheguei quase 3 horas depois.
     
    Durante a viagem comecei a bater mal porque não sentia a perna esquerda - Como eu te compreendo meu caro amigo Rui Briote!!! - .
    Operado de urgência, com muitos pontos e ainda um dreno, fiquei condenado a ir, passados 7 dias, a Santarém para jurar bandeira para não perder a Recruta.
    Fi-lo completamente sozinho em plena Biblioteca da Escola Prática de Cavalaria perante o Comandante (só me lembro que se chamava Banazol).
    As dores eram insuportáveis e cada vez ia descaindo mais para o lado esquerdo, mas jurei aqueles mandamentos todos que me lixei.
    Sim!!!
    Eu posso afirmar que jurei mesmo Bandeira.
     
    Ai não... Esta é para os operacionais.
    Fala-vos um ex-militar que sabe o que é ser ferido por um tiro e viver a incerteza do que lhe poderá acontecer para o resto da vida.
    Tenho ainda mais para vos contar no próprio teatro de guerra.
    Ficará para mais adiante...
     
     
     

    segunda-feira, 30 de setembro de 2013

    AÍ VAI UM RELATO SOB A MINHA ESTADIA EM BEJA - 1971, por Rui Briote

     
    Rui Briote
     
    Mafra ficou para trás e de troca recebi o diploma honoris, causa de amanuense de G3...
     
    Deram-me um papel para as mãos afim de escolher o quartel para onde queria ir e eu feito esperto pus logo Braga..
    Como resposta enfiaram-me em Beja...seria por começar por B? Não sei, nem nunca saberei...

    Em meados de Julho saí de comboio, já não me recordo do dia, à meia noite de Coimbra e cheguei a Beja ao meio dia.
    Foi uma curta e pouca demorada viagem como se vê!...
    Atravessar o Alentejo em pleno verão e à hora do calor num comboio "pára aqui, pára acolá" ...foi uma rica sauna...
     
    Chegado à minha nova morada, tive que me ir apresentar a um militar com muitos amarelos nos ombros. Fiz a continência da praxe, apresentei-me e mandou-me " visitar" os meus novos aposentos.
     
    Ótimos, pois o tempo da caserna foi-se.
    No dia seguinte deram-me de mão beijada 10 cabo-verdianos para lhes ensinar os primeiros passos de dança .
    O trabalho que me deram!
     
    Uns dias depois, caíram, vindos de todos os lados, uma " fornada" de novos candidatos para brincar às guerras...provenientes de todo o país, mas principalmente do Alentejo.
    Eram distribuídos por diferentes salas, despiam-se, víamos o peso, a altura e por aí adiante.
    Foi uma tarefa cansativa e morosa, mas fez-se.
     
    Fiquei com um pelotão com quase 80 homens.
    Comecei logo a matutar como ia descalçar aquela bota, pois eram mais que muitos.. Juntamente com dois cabos milicianos lá procurei levar a água ao moinho.
    Todos os dias de manhã fazíamos um cross ligeiro na estrada em direção a Mértola, uma fila do lado esquerdo, outra do lado contrário.
     
    Ao fim de alguns dias começamos a ter a feliz ideia de no regresso ao quartel trazermos uns melões escondidos na camisa...sabiam tão bem!...
     
    Já no quartel passávamos à instrução debaixo da torreira alentejana...o pior era no intervalo, pois como havia falta de água e como só havia um repuxo tinha que pôr a malta em " pirilau" e de vez em quando era obrigado a dizer ..." Despacha-te, porque todos têm direito ...
    "Muitas vezes acontecia que, chegado a meio da fila já não havia nem gota...
    Os dias passaram e o pessoal começou a dar cartas, tanto a marchar como no manuseamento da menina G3.
     
    Até que chegou o dia de ir à carreira de tiro que ficava a uma distância razoável.
    A sessão decorreu normalmente e por fim regressámos à casa materna.
    Aí chegados fui chamado ao major Ferro que me comunicou que tinha falecido a minha avó paterna. Isto numa terça feira. Fui à secretaria buscar o impresso para preencher o passaporte, aproveitei e perguntei se estava de serviço no fim de semana a que me responderam " não".
    Preenchi logo dois.
    Fui a esse major pedir para mos assinar e o fulano quando se deparou com o impresso para o fim de semana ficou histérico e pura e simplesmente negou-mo.
    Apeteceu-me apertar-lhe os colarinhos, mas travei os meus ímpetos.
    Fiz uma longa viagem até ao Minho e regressei a Beja na sexta, onde me apresentei.
     
    O tal major estava a falar com um amigo meu e, segundo ele, depois de eu sair questionou-o se eu era o Briote...mais palavras para quê...era um " chicalhão"...
        
    Vou passar agora relatar-vos um episódio que meteu cabeça de borrego regado com tinto alentejano e guarda republicana...
    Certo dia, dirigimo-nos em alguns carros até Moura para comer cabeça de borrego regado com boa pinga.
    No regresso passámos por Serpa onde havia uma festa que metia bailarico.
    Aí houve um sarilho que envolveu saias, pois um colega estava a dançar com uma garota e eis senão quando aparece o namorado, o que provocou troca de mimos que culminaram numa " visita" ao posto da GNR.
    Felizmente o problema foi sanado, mas para susto bastou.
       
    Já com os diplomas de bom aproveitamento, estavam prontos a seguir para outras paragens os recrutas passados a " prontos".
     
    Entretanto surge a " boa nova"...mobilizado para Moçambique.
    Fico de rastos, pois nunca esperava que isso acontecesse, pois tinha ficado bem classificado.
    Reagi o melhor que pude e procurei preparar-me psicologicamente para a nova tribulação.
     
    Conjuntamente comigo iriam uns "malandros" a quem dei instrução. Fui incumbido de levar 60 a Santa Margarida. Não imaginam a dor de cabeça que tive a fazer essa " viagem". Com muito custo e dor de cabeça lá os entreguei ao Teixeira Lopes.
     
    Depois de um ligeiro descanso, regresso de novo a Beja para " dar conta do recado" o mesmo será dizer " missão cumprida".
     
    Esta tropa tinha cada uma, pois no mesmo dia obrigaram-me a andar de Aná para Caifás...Fiquei com os bofes de fora!!!
         
    Aos fins de semana ia de vez em quando passá-lo ao Algarve molhar os pés...
    Armadilhados com uma tenda cinco estrelas lá íamos saborear um pouco as águas tépidas e as estrangeiras que por lá nos esperavam.
     
    Foram os melhores dias dessa recruta dada na muito sossegada cidade de Beja...
     
    Rui Briote (2013-10-01)

     

    sexta-feira, 23 de agosto de 2013

    RECRUTA - Pelo Rui Brandão

     
    Destacamento da Escola Prática de Cavalaria em Santarém - 1970
     
     
    RECRUTA

    Dado o tema RECRUTA ser apetecível para a "memória militar" e estar a ser trabalhado com as experiências de cada um, deixem-me explanar um pouco o que passei em Santarém.
     
    Pertenço ao 2º turno de 1970.
    Nessa altura ainda se usava a Mauser para os exercícios e a G3 só para fazer tiro, lá naquela carreira de tiro de episódios com piada (um, dois e três apanha invólucros, o resto vai ver a merda que fez).
     
    As vivências/experiências/ambientes têm muito a ver com as pessoas que compõem os respetivos grupos.
     
    No meu caso direi que tive umas primeiras 4 a 5 semanas de bom ambiente, dado que o aspirante (licenciado em Direito) que nos dava a Recruta era simplesmente um tipo impecável.
     
    No primeiro dia, chegou junto do pelotão e disse: - Meus senhores, sabemos que ninguém gosta disto,... mas vamos aproveitar o que há de bom nesta Recruta, a camaradagem e os exercícios físicos.
     
    Claro está que ficou com o Pelotão na "mão".
    Passadas essas 4 a 5 semanas, um dia apareceu de manhã acompanhado de outro aspirante.
     
    Informou que iria passar para os serviços jurídicos do quartel e seria substituído pelo novo aspirante que agora apresentava.
    Ok, tudo bem.
    Embora deixando saudades.
     
    O novo aspirante, informa que íamos para a carreira de tiro, de imediato dá-nos ordens para NUM MINUTO irmos buscar o capacete à caserna.
     
    Nós estávamos aquartelados no Destacamento.
    Da parada até à caserna e voltar não dava para UM MINUTO.
    Quando voltámos, o aspirante com o seu ar imponente gritou que já tinha passado o tal MINUTO.
    Enchemos 50.
    O aspirante ficou "apresentado".
     
    No próximo Capítulo vou descrever-vos a personalidade deste "cromo".
     
    Rui Brandão 20130731

    sábado, 10 de agosto de 2013

    DUARTE PEREIRA - Um desabafo


    Foto de Fernando Lourenço (CCav 3509)

    ISTO HOJE ESTÁ MUITO TÉCNICO !! 
     
    VOU FALAR DE FARDAMENTO EM SANTARÉM, RECRUTA JAN/MAR 1971 (INVERNO COM CHUVA E FRIO) .
    ACHO QUE NOS DERAM DUAS FARDAS Nº 3 E DOIS PARES DE BOTAS.

    DEPOIS DOS 15 DIAS INICIAIS EM QUE ESTIVEMOS FECHADOS, PENSO QUE ÍAMOS "CHAFURDAR" PARA A TERRAPLANAGEM DA ESCOLA.

    DEPOIS DOS EXERCÍCIOS TINHAMOS DE IR À MANGUEIRA PARA LIMPAR O "FATO" E AS BOTAS.

    MAS À TARDE TÍNHAMOS INSPECÇÃO COM TUDO LIMPINHO. LOGO O QUE VESTÍAMOS NO DIA SEGUINTE LOGO DE MANHÃ PARA IR "CHAFURDAR" OUTRA VEZ ?

    A FARDA GELADA E AS BOTAS MOLHADAS, ERA TÃO BOM COM O TEMPO FRO, LOGO DE MANHÃ PÔR AQUELA ROUPINHA EM CIMA DE NÕS...

    ACHO QUE NA FEIRA DA LADRA COMPREI UMA FARDA 3.

    Duarte Pereira - 201308509


    quarta-feira, 7 de agosto de 2013

    MAFRA 1971...    Em janeiro de 1971 fui "empurrado" para o Convento de Mafra para conhecer umas freirinhas, pensava eu, mas tal não se verificou, pois quando lá cheguei, conheci sim muitas ratazanas que pareciam coelhos. Tanta malta na flor da idade como eu, prestes e enfrentar feras com garras de fora à nossa espera.  Eram só fulanos fardados e empertigados  a olharem-nos de alto a baixo com um olhar ameaçador ...todo encolhido, entrei e trataram-me de me dar uma roupa esquisita e, que remédio, lá fui eu enfiá-la antes que eles mo fizessem. Tive sorte, pois acertaram com o número  e de imediato  fui-me juntar aos  "virgens" nestas andanças. Enfiaram-me numa caserna enorme onde me esperava uma cama beliche ficando eu na parte inferior. Foi aí que conheci os nossos camaradas Ribeiro  e o Lea.,O primeiro ficaria por cima de mim, salvo seja, e na mesma também o Leal. 

   Passados os primeiros momentos em que convivi em amena cavaqueira, chamaram-nos e deram-nos uma G3 sem balas, que seria a minha companheira durante uns tempos. A partir daí começou a minha triste sina...calcorrear a mata de Mafra e a famosa aldeia dos macacos, onde fazíamos exercícios físicos e outros. Foi um período de seis meses divididos em dois. No primeiro, coincidente com o inverno, tive a felicidade de ter como instrutor um tenente miliciano que nos tratava como homens...chamava-se Silva... homem bom. No segundo já me apareceu um alferes da Academia  com ar prepotente e mal encarado que puxava e moía a tola a todos nós. No meio dos trabalhos em que me meti, melhor, em que me meteram, houve um episódio que me marcou para sempre. Era uma quinta-feira, vinha eu da instrução, já na especialidade, quando ao passar por uma lagoa, ouvi um alvoroço enorme. Que teria acontecido? Olhámos uns para os outros, mas a explicação não surgia...Eis senão quando ouvimos  um choro convulsivo...interrogámo-nos...o que aconteceu? Até que alguém nos comunicou que quatro cadetes tinham caído à lagoa. Pensámos logo no pior, o que infelizmente se veio a concretizar...morreram da maneira mais estúpida. Em poucas palavras vou procurar descrever o que se passou. De vez em quando tínhamos instrução nessas lagoas, cuja água era lodosa..o exercício consistia em  atravessar a dita com os pés a andarem em cima duma corda e as mão agarradas às outras duas...á medida que se avançava, as cordas baloiçavam e era sempre um "ai Jesus". Nesse dia aconteceu o pior, pois caiu um e atrás dele foram mais três...UMA TRAGÉDIA. Chegados ao quartel, um  clima de revolta pairava no ar, aliado a uma grande e profunda tristeza . Foi convocada uma "assembleia geral" na sala da psico. Aí ficaram estabelecidas certas reivindicações  afim de garantir a segurança de todos nós e também que ninguém almoçaria, isto é, um levantamento de rancho em linguagem militar. À hora do almoço, já com todo o pessoal reunido no refeitório e já em sentido, o oficial de serviço deu ordem para nos sentarmos, ordem essa à qual ninguém obedeceu...então, o oficial dirigiu-se a um de nós e mandou-o sentar e como resposta recebeu um choro intenso..O clima de hostilidade era enorme. Então, o Comandante para acalmar o ambiente, sendo uma quinta-feira, mandou-nos em fim de semana....
    Rui Briote
          MAFRA 1971...   
    Em janeiro de 1971 fui "empurrado" para o Convento de Mafra para conhecer umas freirinhas, pensava eu, mas tal não se verificou, pois quando lá cheguei, conheci sim muitas ratazanas que pareciam coelhos.
     
    Tanta malta na flor da idade como eu, prestes e enfrentar feras com garras de fora à nossa espera. Eram só fulanos fardados e empertigados a olharem-nos de alto a baixo com um olhar ameaçador ...
    Todo encolhido, entrei e trataram de me dar uma roupa esquisita e, que remédio, lá fui eu enfiá-la antes que eles mo fizessem.
     
    Tive sorte, pois acertaram com o número e de imediato fui-me juntar aos "virgens" nestas andanças. Enfiaram-me numa caserna enorme onde me esperava uma cama beliche ficando eu na parte inferior. Foi aí que conheci os nossos camaradas Ribeiro e o Leal.
    O primeiro ficaria por cima de mim, salvo seja, e na mesma também o Leal.

    Passados os primeiros momentos em que convivi em amena cavaqueira, chamaram-nos e deram-nos uma G3 sem balas, que seria a minha companheira durante uns tempos.
    A partir daí começou a minha triste sina...calcorrear a mata de Mafra e a famosa aldeia dos macacos, onde fazíamos exercícios físicos e outros.
    Foi um período de seis meses divididos em dois.
    No primeiro, coincidente com o inverno, tive a felicidade de ter como instrutor um tenente miliciano que nos tratava como homens...chamava-se Silva... homem bom.
    No segundo já me apareceu um alferes da Academia com ar prepotente e mal encarado que puxava e moía a tola a todos nós.
    No meio dos trabalhos em que me meti, melhor, em que me meteram, houve um episódio que me marcou para sempre.
     
    Era uma quinta-feira, vinha eu da instrução, já na especialidade, quando ao passar por uma lagoa, ouvi um alvoroço enorme.
    Que teria acontecido? Olhámos uns para os outros, mas a explicação não surgia...
    Eis senão quando ouvimos um choro convulsivo...interrogámo-nos...o que aconteceu?...
    Até que alguém nos comunicou que quatro cadetes tinham caído à lagoa.
    Pensámos logo no pior, o que infelizmente se veio a concretizar...morreram da maneira mais estúpida.
     
    Em poucas palavras vou procurar descrever o que se passou.
    De vez em quando tínhamos instrução nessas lagoas, cuja água era lodosa...
    O exercício consistia em atravessar a dita com os pés a andarem em cima duma corda e as mão agarradas às outras duas...
    Á medida que se avançava, as cordas baloiçavam e era sempre um "ai Jesus".
     
    Nesse dia aconteceu o pior, pois caiu um e atrás dele foram mais três...UMA TRAGÉDIA.
     
    Chegados ao quartel, um clima de revolta pairava no ar, aliado a uma grande e profunda tristeza .
    Foi convocada uma "assembleia geral" na sala da "psico".
    Aí ficaram estabelecidas certas reivindicações afim de garantir a segurança de todos nós e também que ninguém almoçaria, isto é, um levantamento de rancho em linguagem militar.
     
    À hora do almoço, já com todo o pessoal reunido no refeitório e já em sentido, o oficial de serviço deu ordem para nos sentarmos, ordem essa à qual ninguém obedeceu...
    Então, o oficial dirigiu-se a um de nós e mandou-o sentar e como resposta recebeu um choro intenso...
    O clima de hostilidade era enorme.
     
    Então, o Comandante para acalmar o ambiente, sendo uma quinta-feira, mandou-nos em fim de semana....
     
    Rui Briote (2013)